quinta-feira, 4 de abril de 2013

Sobre livros e quem os vende




Para cada problema, uma solução específica. Ou mais que uma, se formos engenhosos.
Esta é uma solução para um problema que não temos.

Em fotografando no exterior usamos o sol como fonte de luz. Maior ou menor intensidade, maior ou menor difusão, mas é ele que alumia os assuntos que fotografamos. Geralmente.
Mas em interiores ele não chega, ou pelo menos, não chega com a quantidade e qualidade que queremos. Geralmente.
Por isso, e desde sempre, os fotógrafos procuraram formas de trazer para o interior a quantidade de luz necessária ao seu ofício.
Uma dessas formas – das primeiras – foi o velho flash de magnésio. Vemo-lo nos filmes, que já não se usa. Aquela luz intensa, não tão instantânea quanto isso, e, principalmente, muito fumarenta. Que resultava da queima rápida de magnésio com um nico de pólvora. E, em interiores, depois de cada fotografia, havia que abrir bem as janelas e criar uma valente corrente de ar, para dissipar os fumos daí resultantes.
Esta é uma forma de contornar o problema: um saco, feito a partir de um guarda-chuva, e que se coloca por cima do local da combustão. Assim que se extingue, fecha-se por baixo e vai-se com ele para o exterior, abrindo-o e libertando a fumaça nele contida.
Talvez seja um sistema complicado de usar, mas seria o melhor que existia na época. E soube-o através de um livrinho comprado num simpatiquíssimo alfarrabista. Recomenda-se a visita.
Da simpatia, cada um poderá aquilatar aquando da sua ida lá. Da qualidade e eficiência dos seus proprietários, posso dar um exemplo:
O livro de onde tirei esta imagem intitula-se “Fotografa parte segunda”. Escrito em Castelhano, data de 1952 e foi impresso na Argentina. Quando por ele perguntei o preço, disse a simpática senhora: “Olhe que é o segundo volume. Não tenho o primeiro.” Qualquer outro vendedor teria calado essa informação, tratando de despachar este talvez mais que encalhado livrinho de bolso. Que a grande maioria pouco dariam por ele, a menos que, como eu, saibam que os antigos tinham sabedorias que as modernidades esquecem.
E um dos exemplos dessa sabedoria consta naquilo que não está na imagem: “Bórax – 75gr; Ácido bórico – 60gr; Água – 1 lt”. Trata-se da fórmula que haveria de executar para impregnar o tecido deste saco para o tornar ignífugo ou incombustível. Pequenos detalhes ou sabedorias que hoje escapam à maioria.

Interessante mesmo foi também o que sucedeu depois de sair desta excelsa loja com este tesoiro no saco.
Sendo que se tratava de um dia feriado, nem sequer estava à espera que este alfarrabista estivesse aberto. Mas estava, ao invés de todo o resto do comércio que não pastelarias ou restaurantes.
No passeio preudo-fotográfico que dei, acabei por entrar num centro comercial, um dos mais antigos da cidade e que foi uma referência, ainda que hoje preterido por outros que têm a desvantagem de serem todos iguais.
Neste existe, desde sempre, uma livraria. Mas como é um comércio em declínio – infelizmente – já lhe conheci vários donos e nomes ao longo dos anos. E, desta vez, nova mudança, desta feita uma sucursal de uma outra livraria bem conhecida.
Enquanto olhava de fora, aquilatando do que ali estava à venda, lá dentro apenas três pessoas: dois potenciais clientes e uma empregada. E foi esta que fez toda a diferença:
De pé, atrás do balcão, estava embrenhadíssima na leitura de um livro. Livro que marcou com todo o cuidado e pousou ao lado quando fez uma venda, e que a ele regressou de seguida.
Ora batatas! Uma “menina do shoping” a vender livros e a ler o que vende não é normal. E não pude deixar de ir atrás do meu nariz comprido e meter conversa com ela. Não me recordo do título ou autor, mas não esqueço o mais que ela me disse:
“Sabe, gosto de ler por inteiro pelo menos uma obra de cada autor que temos. Que, assim, posso melhor aconselhar os clientes.”
Perfeito, como já é raro de encontrar!

Falta referir que o alfarrabista é a “Folio Exemplar”, ex-Ulmeiro de boa memória, na Av. Do Uruguai, Lisboa, e que a livraria é a “Apolo 70”, no CC Fonte Nova, também em Lisboa.
Concorrências? Nada disso, que são produtos e clientes diferentes, excepto algum menos convencional como eu mesmo.


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