Está
quase a fazer anos. Mais dias, menos dias, faz anos esta história.
Estávamos
em 1975. Na sequência da revolução, deixara de haver escolas e liceus masculinos
e femininos. E eu havia transitado do Liceu Padre António Vieira para o Liceu
D. Leonor, ambos em Lisboa.
O
ano lectivo 74/75 havia começado tarde, face às confusões naturais de todas as
mudanças que aconteciam e fazíamos acontecer. E o facto de passarmos de ensino
segregado para ensino misto não veio ajudar em nada aa esse iniciar a
aprendizagem em liberdade.
Por
tudo isso, bem como pelos fulgores da juventude agora assim “misturada” e pela
já avançada idade do material escolar, chegámos à Páscoa com falta de cadeiras,
mesas, carteiras, nas salas de aula. Creio que não foram capazes de resistir ao
que acontecia. E as cadeiras partilhavam rabos, nem sempre com os melhores
resultados físicos ou académicos.
Certo
é que eu, estudante do então sexto ano do liceu, junto com uma valente mão-cheia
de colegas, eles e elas, passámos boa parte das férias da Páscoa no sótão do
liceu, a tentar recuperar o material danificado que aí se encontrava.
Enquadrados
por um solícito continuo, manejamos chaves e martelos e serras naquelas
madeiras demasiadamente rijas para os nossos hábitos. Com as consequentes
bolhas nas mãos e uma ou outra arranhadela sem consequências.
Não
recordo números, mas bastantes foram as que saíram dali para as salas de aula,
suponho que capazes de resistir por mais algum tempo àquela formidável maré de
gente jovem.
Gente
jovem essa que acreditava ter o futuro nas suas próprias mãos e que trabalhava
por ele. Com as ferramentas de marceneiro, com os cadernos e livros, com pás e
enxadas nos jardins, vassouras nas calçadas… Acreditávamos que as coisas tinham
que acontecer e que nós estávamos ali para lhes dar corpo.
Creio
que dessa época ainda sobramos alguns dinossáurios, que continuamos a acreditar
que do céu só sol e chuva e que o futuro sai das nossas mãos. Ma seremos
poucos.
Os
restantes de então e os que entretanto vieram acreditam e agem partindo do
princípio que “alguém” cuidará das coisas, através de concursos públicos ou
contratando alguém para o fazer. Principalmente se se tratar de situações que
obriguem a sair da zona de conforto e fazer algo que não reverta directa e
imediatamente para o próprio.
Está
quase a fazer anos que esta história aconteceu. Alguns dos que comigo a viveram
estão por aí para a relembrar.
Mas
não sei, com toda a franqueza e olhando em redor, se tenho vontade de sopras as
velas deste aniversário.
Que
sabemos que o tempo não volta para trás e que a história se repete, mas nem
sempre nas suas melhores vertentes. Ou com melhores protagonistas.
By me
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