quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Da privacidade da fotografia íntima



Passados tantos anos a lidar com fotografia, é certo ter uma boa mão-cheia de imagens que quero manter em privado.
São fotografias íntimas. Algumas da intimidade do corpo, algumas da intimidade da mente, algumas da intimidade das relações humanas, algumas da intimidade das vivências. São fotografias íntimas que devem ser preservadas como privadas e não caírem no domínio público.

Até há alguns anos, fazer fotografias íntimas podia ser uma dor de cabeça. O processamento fotoquímico (revelação, positivação, ampliação) implicava o recurso a laboratórios onde estranhos lidavam com as imagens. A menos, claro, que tivéssemos o nosso próprio laboratório, o que nem sempre acontecia. E o ter fotografias íntimas nas mãos de estranhos, mesmo que profissionais com ética irrepreensível, era algo que deixava um certo nervosismo a quem fotografava e a quem era fotografado.
“Será que não vai haver cópias destas imagens em mãos erradas?”, era um pensamento recorrente.

Nos tempos que correm, este receio é ridículo.
O laboratório pessoal, vulgo “computador”, faz com que as fotografias íntimas, sejam de que género forem, se mantenham na esfera privada de quem as fez ou deixou fazer. Feitas com câmara digital, processadas em casa e guardadas num disco rígido ou óptico, é garantido que não passam por mãos ou olhos errados, mantendo a privacidade que se quer.
Desde que, muito naturalmente, se as não coloquem na web. Não importa se esse colocar é enviar por e-mail ou colocar num arquivo “privado” na nuvem. Estão sempre, e por “sempre” entenda-se “realmente sempre” acessíveis a olhos que não conhecemos e a acções que podemos não querer.
Os servidores de e-mail não são invioláveis, nem os sistemas de arquivo on-line. Como vimos recentemente, há sempre quem consiga quebrar as barreiras de segurança e chegar onde não é suposto chegar. E há sempre decisões judiciais que podem, legalmente, quebrar essas seguranças. Mesmo que por outros motivos perfeitamente legítimos, essas fotografias íntimas e legítimas podem cair em mãos que não deveriam ter acesso a elas.

Donde, virem agora algumas “celebridades” queixarem-se que algumas fotografias íntimas suas estão agora no domínio público é um verdadeiro disparate. Deixaram de ser privadas no exacto momento em que foram colocadas num qualquer servidor de dados que não podem controlar. Mesmo que pertençam a um qualquer departamento governamental de uma qualquer super-potência.
A privacidade de fotografias íntimas (da intimidade do corpo, da intimidade da mente, da intimidade das relações humanas, da intimidade das vivências) só pode ser garantida a 99% se ficarem longe das redes e nunca estiverem, em circunstância alguma, em equipamentos geridos por estranhos. Mesmo que geridos por gente com altos conceitos éticos e práticas equivalentes.
O 1% de incerteza prende-se com o nosso próprio equipamento. É difícil de garantir que o nosso próprio computador não é objecto de intrusão e, muito mais frequentemente, quando o levamos a uma oficina de informática ou a um amigo “para dar um jeito” essas fotografias íntimas ficam de imediato fora de controlo.
A única forma de ter a certeza que essas fotografias íntimas, sejam de que cariz sejam, fiquem dentro da privacidade que queremos, é tê-las guardadas em suportes sempre afastados das redes e que nunca saiam da nossa esfera de influência. De preferência em discos externos que só estão ligados a um computador sob a nossa vigilância. Ou em suportes ópticos (CDs ou DVDs). Tanto as fotografias tratadas como os originais.
Resta falar de uma outra falha na privacidade das fotografias íntimas, sejam de que cariz forem: as feitas com ou guardadas em telemóveis ou equipamentos semelhantes. Que a quantidade destes aparelhos que se perdem ou são roubados por semana é incontável. Ter neles guardadas fotografias que não queremos que caiam no domínio público é o mesmo que sair de casa e deixar a porta escancarada.

A este propósito, recordo-me daquela estorieta:
“- Sabes guardar um segredo?”
“- Sei, claro.”
“- ………..”
“- Então não o contas?”
“- Não. Eu também sei guardar um segredo.”

As auto-estradas da informação não são, garantidamente, o melhor lugar para guardar segredos.


(Nota extra: A imagem não é o que estão a pensar mas tão só dois joelhos encostados.)

By me

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