Ontem
dei comigo a dizer a coisa mais importante que, creio, alguma vez já disse
sobre fotografia.
Estava
de conversa com uma jovem, que ainda nem atingiu o quarto de século, e que tem
um interesse muito sério sobre fotografia. Sério mesmo.
E
sugeri-lhe, visto que só há poucas semanas está em Lisboa, aproveitasse para ir
fotografar uma ou mais manifestações, se e quando acontecessem.
Disse-me
que não, que não era assunto que a atraísse.
Disse-lhe
que, e para além das questões técnicas e estéticas, com todo o manancial de
gente que ali está para registarmos, há também a questão humana, o factor da
história que é a nossa e que fazemos, o nosso olhar sobre o que nos cerca… Não
estava a conseguir convencê-la.
E
disse-lhe que, para além da arte e da expressão pessoal, o nosso papel enquanto
fotógrafos, talvez que o mais importante, será o deixarmos um testemunho real
aos vindouros daquilo que é o nosso tempo. Sempre condicionado à nossa própria
perspectiva sobre o que fotografamos, mas um testemunho.
Ficou
ela a olhar um pouco para mim, na pouca luz que nos envolvia, e fiquei a ouvir
o que tinha acabado de dizer, no silêncio que nos cercava.
Efectivamente,
e para além do grau de importância que possa ter o facto de fotografarmos, o
certo é que o que fazemos hoje serão os testemunhos de amanhã. Será aquilo que,
caso sobreviva à voragem do tempo, à fragilidade dos suportes e ao olvido e
confusão no meio dos milhões de imagens que hoje se fazem, que confrontará a
realidade de hoje com os relatos mais ou menos emocionados daqueles que vivem
os acontecimentos.
Cada
um de nós, ao falar de algo que viveu no passado mais ou menos distante,
ajusta-o e filtra-o de acordo com as suas próprias emoções, “colorindo-o” em
consonância com o tempo decorrido e as vivências tidas. É inevitável.
As
imagens que hoje façamos, passe o tempo que passar, vivamos o que vivermos,
serão testemunho mudos mas imparciais das nossas emoções hoje, não sujeitas a
recordações.
Claro
que serão interpretadas no futuro. E essas interpretações dependerão de quem o
fizer. Tal como hoje mesmo fazemos dos registos pictóricos do passado, no
papel, na tela ou na rocha.
Mas
a quantidade de imagens que hoje são feitas, na sua totalidade, deixam de lado
as subjectividades de cada um dos fotógrafos e resultam numa realidade
incontestável. E por muito tendencioso que possa ser alguém no futuro a
analisa-las, o somatório de todas elas será um testemunho neutro e indesmentível
do que hoje somos, fazemos e pensamos.
Hoje
fotografamos porque nos apetece. Porque o assunto nos atrai, porque é a nossa
forma de expressão, porque é actividade na moda.
Mas
os vindouros – uma, cinco, dez gerações – agradecerão que o tenhamos feito,
sejam quais forem as nossas motivações agora.
E,
em jeito de recado para o caso de ela ler estas linhas, sempre acrescento que
não! As manifestações de rua, políticas ou sociais, não são todas iguais.
By me
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