quarta-feira, 26 de janeiro de 2011
Funeral
Não parece. Eu sei que não parece! Mas o que aqui se vê é um funeral.
Os cangalheiros são funcionários da autarquia, as carretas também pertencem à câmara municipal e o morto…
Bem, o morto é transportado em pedaços.
O destino, no lugar de um cemitério convencional, com campas, placas de eterna saudade e flores, nem sempre viçosas, será um qualquer armazém onde, identificadas e separadas as peças do defunto, ficarão elas à espera de uma ressurreição.
Fora de brincadeiras (ou talvez não), o que aqui está a acontecer é o retirar das placas de madeira colocadas atempadamente para servirem de suporte aos cartazes da campanha eleitoral.
Quatro placas, de bom tamanho, mas que dificilmente comportariam cartazes de todos os candidatos. Problema que não se levantou, ao que julgo saber, já que apenas uma das candidaturas ali afixou o que queria mostrar. Aliás, colocou dois cartazes, lado a lado mas que triste figura fizeram, na solidão da enormidade das madeiras e na distância a que se encontravam dos pedestres que ali passassem, a caminho ou de regresso do trabalho.
Foi este equipamento cívico levantado no dia seguinte ao que serviu (e assim estava previsto) para repetir o acto eleitoral.
Triste mesmo é que o defunto já estava em condição de morto bem antes da ida às urnas. A falta de vontade no uso do direito de voto fez com que, mais que serem úteis, estes placards não passassem de desperdício. Que estarem lá ou não seria bem o mesmo.
Fica-me o desejo que na sua ressurreição, este ano ainda ou no próximo, os meus concidadãos entendam que o voto, mais que eleger uns quantos sobre quem possam recair suspeitas não muito lisonjeiras, estão os eleitores a decidir sobre as suas próprias vidas:
No fazer das leis, no definir e cobrar impostos, no impedir, no autorizar, no impor o nosso quotidiano.
E quando são os outros que decidem por nós, a carreta é preta, os cangalheiros não usam colectes reflectores e a relva só cresce depois de tapada a cova. A nossa cova!
Texto e imagem: by me
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