domingo, 23 de janeiro de 2011

Secção de voto



Tive um colega que, para além de ser meu vizinho na freguesia, era igualmente vogal na respectiva junta.
Uma noite, dava-me ele boleia depois do trabalho, e questionei-o sobre o para onde enviar uma proposta de construção de um caramanchão num largo lá da zona, a fim de os velhotes reformados ali pudessem estar mais um pedaço, mesmo com a humidade normal do fim do dia.
A resposta deixou-me aterrado:
“Mas, oh JC: não vale a pena. Os velhos não votam!”
Para além de ficar furioso com esta opinião de um autarca eleito, fiquei bem triste com o desconhecimento que ele tinha (e suponho que muitos terão) sobre o que é acto eleitoral e o que ele significa para muitos.
É que os idosos, e corrija-me quem mais souber do assunto, são os que menos se abstêm. Desde que possam deslocar-se à mesa de voto, comparecem, por vezes com visível dificuldade. E, para que se tirem teimas, esteja-se um pedaço junto a uma secção de voto e faça-se uma estatística, mesmo que mental.
Tenho para mim dois motivos para tal, qual deles de maior peso:
Por um lado, um idoso, já reformado, ao votar e ao ser assinalado no respectivo caderno eleitoral que ali esteve está, de alguma forma, a afirmar que ainda está vivo e que ainda é útil. É uma espécie de grito ao mundo em que se proclama bem alto que ainda cá se está e que ainda podem contar com ele/a.
Mas, por outro lado, grande parte desses idosos passaram parte da suas vidas a não poderem votar ou, em podendo, a saber que de pouco adiantaria, já que as eleições estavam viciadas à partida. Poder fazê-lo e saber que, à medida de cada um, estão a influir no seu futuro e no dos seus, é algo de precioso que eles souberam o que era não ter.
Hoje está frio. Acentuado por um vento cortante.
Apesar disso, na escola do meu bairro onde votei, os idosos têm vindo a comparecer. Alguns, para alegria minha, acompanhados de petizes, tão encapuçados quanto os avós. Que, apesar do desinteresse que os pais destes minorcas manifestam pela democracia, restam ainda os mais velhos para dar o exemplo.
Não me esqueço da emoção que senti aquando da primeira vez que pude colocar o boletim de voto na urna. Espero que estas crianças o possam vir a sentir também, a despeito dos exemplos parentais.


Texto: by me
Imagem: edit by me

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