Tenho
um relógio!
Na
verdade, tenho muitos relógios espalhados pela casa, em funcionamento ou não.
De pilha, de corda, de bolso, de parede, de pulso, de areia, de sol, autónomos
ou inseridos em algum equipamento…
Para
a panóplia estar razoavelmente completa, faltam-me, entre outros, uma
clepsidra, uma vela graduada, um de cuco…
Mas,
para o caso, o que interessa é este relógio.
Possuo-o
há trinta anos. Foi comprado a um companheiro de trabalho que “ganhava uns
cobres por fora” com artigos de contrabando. Alguém se recorda das Inoxcrome?
Suponho que possa falar disso agora, que os prazos legais já prescreveram.
Comprei-o
por ser automático. Ainda que seja de corda, não necessita que rodemos o
“pinchavelho” para que trabalhe. Possui um pequeno mecanismo no interior que,
com o simples movimento do braço põe a mola sob tensão e o sistema a funcionar.
Prático.
Claro
que se o deixarmos em repouso por uns dias, pára. Nada que, ao tornar a usar,
meia dúzia de safanões não resolvam a coisa.
O
mostrador não possui números. Mas também não fazem falta.
Quando
olhamos para um mostrador de um relógio, poucas se algumas serão as vezes em
que queremos saber ao certo que horas são, com o rigor da hora, minuto ou segundo.
Aquilo
que procuramos saber é, de facto, quanto tempo passou ou falta para um dado
acontecimento. Se estamos atrasados ou adiantados. Se iremos esperar ou ser
esperados. Se a nossa impaciência tem ou não razão de ser.
Se
perguntarmos a alguém pelas horas, logo a seguir a esse alguém ter olhado para
um relógio, o mais certo é essa alguém olhar de novo, que não fixou o valor mas
apenas a relativização do tempo. E não sabe que horas são.
O
facto de este relógio ser de pulso não me agrada em particular. Sentir o braço
preso por uma correia, ou seja o que for preso seja com o que for,
desagrada-me.
O
tipo de relógio que gosto de usar é de bolso. Não apenas não me prende em coisa
nenhuma quando trabalhamos, como não nos preocupamos com a água nem nos estraga
os punhos das camisas.
Acontece
que os relógios de bolso têm alguns inconvenientes para mim. Ou bem que são
mecânicos, de corda e volumosos, parecendo mais armas de arremesso que
aparelhos de medida de tempo, ou, para serem de tamanho e peso reduzido, são de
preços incomportáveis. Em alternativa, são de pilha. Tenho vários destes.
Mas
a pilha gasta-se e, as mais das vezes, acabo por não ter paciência para
procurar uma nova. E, cada vez mais, os relojoeiros não querem vender pilhas
mas relógios novos! E descartáveis! Descartáveis como o tempo!
Por
tudo isto, vota e meia lá estou eu a usar por uma temporada este velhinho
relógio de pulso, fiel como poucos.
Tem
uma enorme vantagem sobre os demais que possuo: Desde que o adquiri, que se
adianta regularmente uns vinte e tal segundos por dia. Não se trata de um
defeito, mas antes de uma desafinação. Mas que demonstra a sua qualidade, já
que se mantém inalterável há trinta e tal anos.
Mas,
dirão alguns, assim nunca sabes ao certo as horas!
Pois
não! Mas se, por um lado, não é importante sabê-lo, por outro ou bem que chego
no momento aprazado ou então adiantado. Nunca atrasado.
Ou
seja, trata-se de um aparelho de medida pouco rigoroso e que me satisfaz por
completo no seu funcionamento.
Talvez
porque a vida não é exacta nem tem bitolas!.
By me
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