Dizer “O homem foi
morto pela polícia” ou dizer “O homem foi abatido pela polícia” ou dizer “O
homem foi assassinado pela polícia” não é a mesma coisa.
Se no primeiro
caso é meramente factual, no segundo o mesmo facto reveste-se de um carácter de
legitimidade enquanto que no terceiro toma foros de crime.
Os bons
profissionais das escrita sabem-no bem, quer sejam ensaístas, romancistas ou
jornalistas. A escolha das palavras, mesmo que de significado próximo, fazem
toda a diferença.
O mesmo acontece
com o tom de voz e o semblante com é dito: sério, contristado, jocoso,
cúmplice… a forma como cada uma das frases acima referidas for dita reforça,
neutraliza, inverte ou subverte o sentido das palavras. Qualquer actor,
político, professor ou jornalista o sabe e o usa.
Na imagem também
há variáveis de interpretação perante o mesmo assunto: de perto, com um grande
ângulo de visão, bem de longe com uma objectiva potente; de baixo ou de cima; com
luz crua ou difusa; com maior ou menor contraste, com maior ou menor profundidade
de campo… se uma imagem vale mil palavras, há mil formas de fazer uma imagem de
um mesmo assunto ou facto. Qualquer pintor, fotógrafo, director de imagem,
jornalista ou realizador o sabe e usa.
A questão põe-se
no uso que é dado à palavra, ao som, à imagem.
Se se tratar de
ficção, entretenimento, trabalho de autor, qualquer método ou opção é sempre
válida, desde que o seu resultado corresponda às ideias de quem faz. Pretende
ele criar no receptor sensações como resposta aos estímulos que produz. E o céu
é o limite, dirão alguns que entendem haver limite ao acto de criar.
Mas se objectivo
for informar, tornar o receptor conhecedor de um dado facto sem lhe querer
condicionar as reacções, aí a coisa fia bem mais fino.
As escolhas das
palavras, dos sons, dos enquadramentos, luzes e contrastes não devem reflectir
a opinião de quem produz. As opções deverão ser tão neutras quanto o possível,
deixando que as opiniões sobre o contado sejam produzidas pelo receptor.
Não é fácil esta
abordagem! Implica, por para de quem produz conteúdos, um distanciamento
pessoal tão grande quanto o possível dos factos relatados, uma abordagem neutra
e isenta. E, convenhamos, só os bons profissionais (ou os que, não sendo
profissionais, nasceram com o dom) o conseguem sem esforço.
Os outros, os
normais, recorrem a diversas técnicas específicas do ofício e das ferramentas
que usam, para garantir a neutralidade do que contam.
Uma delas é, sem
sombra de dúvida, a igualdade de tratamento, não importa qual o assunto ou
quais as simpatias. Uma abordagem idêntica, na palavra, no som ou na imagem,
garante a isenção ou imparcialidade, amemos ou odiemos aquilo sobre o que
escrevemos, falamos ou captamos.
Uma vez mais digo
que não é fácil. Quem conta o que vê ou ouve também é humano, também reage
emocionalmente. Mas é aí, na forma de reagir, que se reconhecem os
profissionais, por um lado, e os amadores ou demagogos por outro.
Mais ainda: quanto
mais próximo se está do assunto que se conta, mais difícil a separação entre
emoções pessoais e o ofício. E o inverso também é verdade: o redactor, frente
aos despachos das agências, o pivot num noticiário ou o editor de vídeo ou
fotográfico têm a reserva emocional de estarem à distância e de poderem
respirar fundo antes de abordarem o assunto.
Por tudo isto (e
mais uns trocos que chegariam para encher umas estantes de uma biblioteca) que
entendo que alguém, trabalhando na retaguarda informativa e fazendo questão de
ter uma abordagem personalizada e distinta do seu ofício só pode ter duas
classificações:
Ou bem que é um
absoluto incompetente no que faz, não percebendo nada da diferença entre
informar e recrear, entre comunicação de massas e trabalho d’autor;
Ou então é um
exímio manipulador, alinhado por ideais específicos, usando das prerrogativas do
seu ofício para manipular a sociedade que consome, ingénua, o que produz.
Tenho para mim que
um incompetente ou se ensina ou se afasta, com o carinho que uma e a
indiferença que a outra situação merecem.
Já um manipulador
de opiniões…
By me
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