sexta-feira, 4 de setembro de 2015

"On photography"



Falemos de fotografia, de uma forma tão fria quanto o possível perante estas imagens terríficas.
Tentemos interpretar as imagens e as respectivas emoções que nos provocam, partindo nós do princípio que somos capazes de nos esquecermos da nossa condição humana e que nos transformamos em meros analistas.
Se formos capazes.

Estas são as imagens que correm mundo. Estas são as imagens que estão a fazer (ou a ajudar) que um pedaço do mundo mude.
Mas qual delas a mais forte? Qual delas nos provoca mais emoção? Porque motivo a maioria dos jornais escolheram uma das três, e apenas uma, para sua capa?
A imagem da criança, caída e isolada na linha de água é terrível. Com a cara na água, imóvel, tão imóvel e frágil quanto pode ser um corpo de criança afogada, morta. Dói-nos, forte e feio a sua fragilidade, a sua condição de inocente vítima. Entra-nos pelos olhos e pela alma.
A imagem da criança ao colo do homem é terrível igualmente. Quase que uma tentativa última, se mais do caso não soubéssemos, de salvar aquele corpo de um fim terrível. Que conhecemos como inútil.
A imagem da criança caída com o homem de pé, aparentando não interagir com ela é, creio, de todas a mais forte. A cara na água e o adulto a nada fazer, por saber (e assim desta forma nos ser dito) que nada há a fazer.
Repare-se que não é a imagem mais detalhada a mais impressionante. Nem a imagem de acção. É a da imobilidade, a estática, a do “não há o que fazer!”.

Creio ter sido esta a interpretação dos editores de imagem ou dos directores, ao escolherem a da imobilidade do adulto como capa.
Terá sido, suponho, a história que ela conta, bem mais que aquilo que conseguimos ver, que a transforma na mais forte e, por isso, a mais eloquente.
Mais que a forma, mais que o conteúdo, será a interpretação que dela fazemos, o que nela lemos, que a torna numa fotografia que, acredito, será icónica no futuro. No que ela nos conta sobre uma criança.

Tão importante quanto a técnica, tão importante quanto a estética, é a semiótica que transforma uma imagem em algo que memorizamos.

E é fria esta análise? Talvez seja. Possível de ser feita daqui a uma semana ou um mês, quando as emoções tiverem esfriado? Talvez.
Mas creio ser agora, quando as emoções ainda estão quentes, que mais facilmente consigo disto falar.

Ou talvez seja a minha própria forma de exorcizar o meu sentimento de culpa colectiva e civilizacional de tal ter acontecido.

By me

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