Falemos de
fotografia, de uma forma tão fria quanto o possível perante estas imagens
terríficas.
Tentemos
interpretar as imagens e as respectivas emoções que nos provocam, partindo nós
do princípio que somos capazes de nos esquecermos da nossa condição humana e
que nos transformamos em meros analistas.
Se formos capazes.
Estas são as
imagens que correm mundo. Estas são as imagens que estão a fazer (ou a ajudar)
que um pedaço do mundo mude.
Mas qual delas a mais
forte? Qual delas nos provoca mais emoção? Porque motivo a maioria dos jornais
escolheram uma das três, e apenas uma, para sua capa?
A imagem da
criança, caída e isolada na linha de água é terrível. Com a cara na água,
imóvel, tão imóvel e frágil quanto pode ser um corpo de criança afogada, morta.
Dói-nos, forte e feio a sua fragilidade, a sua condição de inocente vítima.
Entra-nos pelos olhos e pela alma.
A imagem da
criança ao colo do homem é terrível igualmente. Quase que uma tentativa última,
se mais do caso não soubéssemos, de salvar aquele corpo de um fim terrível. Que
conhecemos como inútil.
A imagem da
criança caída com o homem de pé, aparentando não interagir com ela é, creio, de
todas a mais forte. A cara na água e o adulto a nada fazer, por saber (e assim desta
forma nos ser dito) que nada há a fazer.
Repare-se que não
é a imagem mais detalhada a mais impressionante. Nem a imagem de acção. É a da
imobilidade, a estática, a do “não há o que fazer!”.
Creio ter sido
esta a interpretação dos editores de imagem ou dos directores, ao escolherem a
da imobilidade do adulto como capa.
Terá sido,
suponho, a história que ela conta, bem mais que aquilo que conseguimos ver, que
a transforma na mais forte e, por isso, a mais eloquente.
Mais que a forma,
mais que o conteúdo, será a interpretação que dela fazemos, o que nela lemos,
que a torna numa fotografia que, acredito, será icónica no futuro. No que ela
nos conta sobre uma criança.
Tão importante
quanto a técnica, tão importante quanto a estética, é a semiótica que
transforma uma imagem em algo que memorizamos.
E é fria esta
análise? Talvez seja. Possível de ser feita daqui a uma semana ou um mês,
quando as emoções tiverem esfriado? Talvez.
Mas creio ser
agora, quando as emoções ainda estão quentes, que mais facilmente consigo disto
falar.
Ou talvez seja a
minha própria forma de exorcizar o meu sentimento de culpa colectiva e
civilizacional de tal ter acontecido.
By me
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