Uma ocasião, faz
tempo, estava eu entretido de volta do teclado a tentar grafar umas ideias
surgidas no banho, e tocam-me à porta.
Ponderei não
atender. Não apenas estava como vim ao mundo, se bem que com uma barriga
notoriamente maior, como não me apetecia interromper o curso do raciocínio
iniciado na banheira.
Mas do outro lado
da porta não aceitaram um “não” mudo e insistiram no pressionar do botão da
campainha.
Chateado, sem
mesmo vestir o que quer que fosse ou apanhar o cabelo solto, abri a porta, mantendo
apenas visível a cabeça e parte de um dos ombros. Não numa atitude pudica da
minha parte, mas para evitar ferir susceptibilidades.
No patamar, dois
homens de fato e gravata, com a camisa alva a contrastar com o tom de pele e
com uma pasta na mão, queriam falar-me de um futuro religioso apregoado não sei
por que deus. O deles, certamente.
Tentei ser cortês
e declinar o convite para a conversa e receber o opúsculo que me queriam
impingir. Tentei uma vez, tentei duas vezes, tentei três vezes. Usando mesmo o
argumento já estafado de professar a religião xintoísta e de pouco termos em
comum.
De nada serviu,
que a insistência deles ultrapassava qualquer boa dose de cortesia.
Dando um passo
para o lado e abrindo a porta de par em par, perguntei-lhes se não tinham
entendido o que lhes havia dito e se seria necessário ser rude para que me
deixassem em paz.
Posso deduzir que
foi a amplitude da minha barriga, junto com o tamanho do meu cabelo, que os fez
abrir a boca de espanto. E ficarem pálidos, de um cinza mate esverdeado que nem
sei se consta da colecção do Pantonne.
Sei que após uns
segundos de silêncio no patamar da escada, desejaram-me os bons dias, viraram
costas e afastaram-se.
Aqueles não
voltaram, apesar de não terem passado palavra e outros já cá terem vindo depois
disso. Mas não voltou a ser necessário exibir a plenitude do meu ser para me
deixarem em paz.
Cabelo, barba e
barriga e etc. incluídas.
By me
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