quarta-feira, 13 de abril de 2011

Jornal na Linha



Todos os nomes são ficção!

Chama-se Isabel e tem 48 anos. Trabalha na limpeza da firma e parece uma formiguinha, sempre de um lado para o outro, mantendo tão impecável quanto o apertado das rondas impõe, as mesas e os cenários, por um lado, os sanitários por outro.
Chama-se João e tem 52 anos. É mecânico de precisão, com especialidade em óptica, e está para vir a primeira objectiva de fotografia, cinema ou vídeo que não saiba reparar, com peças recuperadas ou mandadas vir de fábrica.
Chama-se Joana e tem 49 anos. É assistente de produção e conhece, como poucos, a forma de colocar uma pequena multidão em ordem, ou os impressos certos a serem preenchidos para os cachêts. A sua agenda de contactos telefónicos vale o que pesa em ouro.
Chama-se Pedro e tem 51 anos. É técnico administrativo e nunca soube eu, por experiência própria ou de ouvir dizer, que algum trabalho por ele feito tenha sido recusado por imprecisões ou erros. Em gestão de pessoal ou meios técnicos também poucos lhe levam a melhor.
Chama-se José e tem 53 anos. É técnico de imagem e, apesar de a idade já não recomendar muitas horas com a câmara no ombro, poucos o desafiam para um travelling, para acompanhar uma jogada de bola ou conhecer os tempos e contra-tempos de uma música para saber o quando mudar de perspectiva.

Como disse no início, todos os nomes são ficção! Mas são estes e muitos outros, mais especializados ou mais indiferenciados que terão o seu futuro pintado de muito negro com a fobia agora no auge das privatizações para salvar o mundo. Ou o país.
Que quem quer que queira aceitar comprar a empresa, esta ou qualquer outra de qualquer outro ramo, das primeiras coisas que fará será a redução de pessoal, trocando os quadros experientes por mão de obra contratada a uma qualquer empresa de outsorcing, sem responsabilidades patronais, sem contratos de trabalho ou limites de horários, pagando-lhes muito menos de metade do que agora é pago. Como se o que agora é pago fosse alguma fortuna.
Acontece também que estes a que me refiro e cujos nomes são ficção, não tendo idade para reformas, receberão uma indemnização mixuruca (que também essas serão reduzidas no quadro legal) e cedo terminará o subsídio de desemprego. E quem os quererá contratar?
A menos que seja por um empresário de visão e que saiba que idade pode ser uma mais valia importante devido à experiência, com mais de 40 anos ninguém é contratado.
Temos assim, e não estou a pintar as coisas com cores demasiado fortes, que o que aí se avizinha será, talvez, uma solução para o colectivo, com aparentes soluções empresariais de privatização. Mas os custos sociais que isso irá implicar serão gigantescos.
Porque aquilo de que se tem falado como empresas a privatizar, alem de ser um rombo nos bens públicos, têm muita gente (uns milhares bem contados) a quem esta história aqui contada, com nomes fictícios, irá acontecer.
A pergunta que se impõe é: estará cada um de nós na disposição de concordar que, para o bem comum, alguns (muitos) sejam deitados fora como um jornal velho ao sabor do vento?

Na resposta que der a si mesmo (e que não espero que aqui a deixe), não se esqueça de usar adjectivos para se auto-classificar!


Texto e imagem: by me

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