sábado, 23 de abril de 2011
Com doces e bolos
O texto que se segue é aquilo a que se poderá chamar “Politicamente incorrecto”!
Surgiu agora na sequência de uma pergunta, dúvida ou mal-entendido algures num outro fórum a que pertenço. Foi escrito em cima do joelho, na verdadeira acepção da palavra, numa pausa entre dois programas, sentado na escada do pátio onde vamos fumar o cigarro da nossa impaciência.
É a materialização de ideias antigas e um re-escrever de memória de um outro semelhante escrito e apresentado há mais de 30 anos, numa aula da filosofia. Valeu-me então fortes críticas e contestações.
Mas o meu sentir de então não mudou, talvez apenas as palavras e a construção das frases. Assim como alguma pesquisa para rigor de factos.
Aqui fica, tal como saiu da caneta para o papel.
Nos finais do séc. XIX os equipamentos militares eram francamente diferentes dos de hoje.
A cavalaria era mesmo composta por cavalos e não por carros blindados, a artilharia não possuía o alcance e a eficácia da actual e os aviões estavam ainda a descobrir como levantar voo.
Por isso, o eliminar do inimigo de uma posição fortificada (cidade, castelo ou trincheira) processava-se essencialmente à força de braços e de pernas: após o tiro de barragem de artilharia que supostamente abriria brechas nas fortificações e linhas inimigas, a infantaria carregava contra elas de espingarda em riste e baioneta calada. Os defensores ripostavam a tiros de canhão, de espingarda, de granada e, em último recurso, no corpo-a-corpo.
Ganhava quem tivesse mais gente ou munições.
Mas até que a infantaria assaltante chegasse às linhas inimigas, os canhões faziam razias nas tropas ofensivas. Das primeiras vagas de assalto, poucos eram os que se salvavam ou ficavam incólumes.
A esta massa humana que tombava em frente às trincheiras chamavam “carne para canhão”. Que marchava de peito descoberto contra os canhões que os massacrava.
O Hino Nacional Português, que se chama “A Portuguesa”, foi escrito e composto em finais do séc. XIX, em 1890, com letra de Henrique Lopes de Mendonça e música de Alfred Keil.
Glorifica a pátria e a sua defesa a qualquer preço, incitando os patriotas a lutarem por ela até ao alento final, ao sacrifício último, até “marcharem contra os canhões”. Até serem carne para canhão!
Não há guerras limpas! São todas sujas de sangue, ossos, vísceras e cérebros esparramados nas terras de ninguém das frentes de combate ou nas retaguardas bombardeadas.
A “Doce morte do herói” é um mito construído por poetas e ideólogos que, longe do horror da carnificina, se imaginam vitoriosos.
Todos, ou quase, os que declararam guerra ficaram na retaguarda, protegendo a sua integridade com a necessidade da estratégia.
As vitórias declaradas por generais e políticos, foram-no assentes na “carne para canhão” que marchou sobre as trincheiras e sucumbiu enlevada por cânticos como A Portuguesa.
Mas não pensemos que somos piores que os demais. A maioria dos hinos nacionais baseia-se no mesmo conceito: Que há que dar o corpo ao manifesto e a vida em defesa de ideais patrióticos. Que a maioria dos que a dão ou não entende ou desconhece.
Estará, talvez, na altura de pensarmos no significado das palavras que se cantam e ver bem a cor dos “Doces e bolos com que se enganam os tolos”!
Texto e imagem: by me
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