quinta-feira, 23 de setembro de 2010
Aqui ao lado
O terreno que deu origem ao meu bairro não está todo edificado.
Felizmente!
Correspondendo a uma área de talvez 15% da Tapada original, tem apenas alguns arruamentos delineados por caminhos aplainados e batidos por maquinaria, mas não alcatroados. Há muitos anos que está assim. Entre eles, que definem quarteirões a construir, sobram terras avulsas, pejadas de ervas, algumas árvores, poucas, e bicharada variada, que vai de borboletas e mosquitos, a melros e pardais, passando por lagartixas e, eventualmente, outros repteis e morcegos. Dos pequenitos, mas já dei com eles. Sendo ainda que os terrenos já foram drenados, já por lá não encontramos nascentes e os respectivos charcos com batráquios, como foi em tempos.
Como a zona não está reservada contra a construção, mas tão só a falta de investimento impede o avanço do betão, não tem havido motivos para que arda, o que a tem poupado nos verões quentes.
Este baldio, que fica nas traseiras de minha casa, é bordejado por uma rua alcatroada, que facilita o acesso à minha, evitando as rotundas que entraram na moda nas urbanizações modernas.
Mas, não estando edificada, não possui as infra-estruturas habituais, como seja iluminação pública.
Uso esta rua como acesso pedonal ao supermercado da zona e quando regresso a casa de táxi, tarde na noite.
Um destes dias, melhor, uma destas noites, disse-me um motorista que isto deveria ser construído, já que assim metia medo. A qualquer momento poderia sair alguém do escuro para um assalto, quer fosse de carro, quer fosse apeado.
A minha resposta fê-lo rir o que restava dos 300 metros de rua ou estrada escura, cortada a meio por uma curva em cotovelo: “Bem, se estão à minha espera, bem podem passar frio!”
Em qualquer dos casos, o seu comentário é bem indicativo de como pensa o comum dos mortais: se o local é solitário, é de ter medo!
Por mim, admito, receio ou medo mesmo tenho-o no meio das pessoas, já que são elas quem, eventualmente, me poderão fazer mal. Agora sozinho, no meio da natureza e na ausência de seres humanos, a única coisa que nos poderá fazer mal seremos nós mesmos com os nossos receios atávicos ou com a incapacidade de ouvirmos o silêncio e a nós mesmos. E se ao bicho-homem citadino retirarem os ruídos das máquinas e os zumbidos das energias, retiram-lhe a base onde, supostamente, se apoia.
Espero, muito sinceramente, que a crise imobiliária se mantenha por algum tempo e que este terreno não seja abarbanhado por escavadoras e betão, permitindo-me, de quando em vez, ver abelhas, ouvir o vento e sentir a luz, bem aqui ao lado de casa.
Texto e imagem: by me
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