Encontrámo-nos,
casualmente, na cidade.
Ele no seu mister
de escrevinhar o que outros veriam e ouviriam, eu nas minhas deambulações
fotográficas, de intervenção ou não.
O dia caíra havia
pouco e por perto alguns e algumas estavam por ali, como de costume, usando
aquele espaço público e conhecido como ponto de encontro, troca de recados e
recomendações aos parentes distantes, bem como alguns negócios públicos ou não
tanto.
Ficámos um nico de
conversa, em memória de tempos idos, falando de conhecidos e de actualidades,
enquanto mais nada acontecia. Alguns risos de circunstância e piadas de múltiplos
sentidos.
Eis que se
aproxima um dos circundantes. As suas roupas velhas e pouco cuidadas condiziam
em higiene com a pele e o cabelo e nada discordantes do passo pouco certo com
que caminhava.
Depois de um “boa
noite”, a sua voz continuou entaramelada, pedindo-nos desculpa por não estar
nos seus melhores dias mas que em compensação, não andava a roubar. E se algum
de nós lhe poderia dar um cigarro.
Tanto eu como o
meu interlocutor estávamos a fumar.
Ele deu meio passo
atrás, vocalizando uma qualquer desculpa que não percebi. Eu meti a mão ao
bolso e retirei a cigarreira, que abri à sua frente.
Tirou um cigarro,
com o cuidado possível dos seus gestos um pouco erráticos, pô-lo na boca e
acendeu-o. Deu uma fumaça, funda, e agradeceu-nos. E, com mais umas palavras,
esticou-nos a mão em gesto de despedida e agradecimento.
Enquanto a
apertava eu, o que comigo estava por via dos acasos das ruas recuou mais meio
passo, pondo as mãos atrás das costas.
O meu olhar no
momento, bem como depois, enquanto o fumador se afastava, terá dito tudo aquilo
que me queria brotar pela boca.
E ouvi: “Eh pah!
Sei lá por onde andaram aquelas mãos sujas!”
Não comentei.
Limitei-me a virar costas e afastar-me.
É curioso como,
depois de termos trabalhado juntos uns bons anos, de ele ter mudado de patrão e
agora de ofício, este é o momento que recordo com mais intensidade.
Espero que, na sua
nova actividade, consiga continuar a ter as mãos limpas.
Porque a alma,
essa, já nem com ácido!
By me
Sem comentários:
Enviar um comentário