Estava
de férias em Lagos.
A
família regularmente alugava a mesma casinha nos limites rurais da cidade e
íamo-nos espraiar de manhã e à tarde para a meia praia.
Uma
ocasião vi um glorioso carro dos anos 50 estacionado na avenida marginal.
Impecável, parecia acabadinho de sair da fábrica. A seu lado, uma pequena
palmeira no passeio. Mais ao fundo, a muralha de pedra do porto e o céu azul.
Este
conjunto sugeriu-me uma imagem a fazer, desde que com a luz no ângulo certo.
Feitas as contas e olhada a bússola, seria pelo meio-dia.
Uns
dias depois, tendo o céu a limpidez adequada, parti descendo a colina,
carregado com a câmara, as ópticas, os filtros, o tripé… toda a parafernália.
Havia que chegar ao local a tempo de apanhar o sol na posição certa.
A
meio caminho sou interpelado por um casal de velhotes que caminhava em sentido
inverso:
“Olá,
como está?”
“Desculpem
mas… conheço-vos?”
“Não
se lembra de nós?”
“Confesso
que não. Querem ajudar-me?”
“Em
Coimbra, junto à Sé velha, há uns anos… Aquela fotografia que nos tirou…”
Recordei-me
então e ficámos um niquinho à conversa.
Reformados
que estavam, aproveitavam quando estava bom tempo para passear e conhecer o
país como não tinham podido quando jovens.
E,
à medida que iam viajando, iam fotografando o que viam, enquadrando-se ora um
ora outro na imagem. Tinham uma única fotografia de ambos desses passeios:
Aquela em que eu me tinha oferecido para fazer com a câmara deles, em Coimbra,
aquando de uma das minhas peregrinações ao Encontros de Fotografia.
Apenas
uma, de milhares que tinham. Apenas uma que os mostrava aos dois. Partilhando
os Outonos amenos da vida e de Coimbra.
A
minha oferta, tão natural quanto um copo de água, marcou-os indelevelmente.
Aquela fotografia não é uma fotografia para eles: É “A Fotografia”.
Confesso
que na altura já nem me recordava do facto. E, não fora eles, nem nunca mais o
recordaria, de entre muitas situações semelhantes vividas.
E
esta fotografia, que nunca vi, é uma daquelas que consta do meu álbum de
recordações. Não como um ponto de viragem, mas mais como um parágrafo no livro
que vamos escrevendo e a que chamamos vida.
Quanto
à foto do carro? Bem, a hora de verão está atrasada em relação à solar, pelo
que cheguei demasiadamente tarde nesse dia. Voltei lá mais tarde, mas não
consegui dar-lhe aquele ar retro-californiano que queria.
Não
adianta imitar. Há que ser espontâneo e generoso na fotografia, tal como na
vida.
By me
Sem comentários:
Enviar um comentário