Naquele
tempo, digital era o que tínhamos nas pontas dos dedos.
E
o conhecimento também era digital: o passar dos dedos pelos livros e revistas.
Não
estava ele, o conhecimento, em permanência ao nosso alcance. Na bibliotecas –
privadas, dos amigos, das escolas, públicas… - era lá que íamos tirar dúvidas.
Que, em não havendo telefones moveis para perguntar a um compincha ou
professor, haveria que esperar o chegar a casa, ou ao café, ou ao clube, ou à
escola, e esperar encontrá-los para perguntar.
A
alternativa eram pequenos livros de bolso, estilo compêndios condensados, que
traríamos connosco, contendo as informações mais pertinentes e mais difíceis de
fixar.
Regra
geral, tratavam-se de edições estrangeiras, que pouco havia disso em língua
portuguesa: francês, inglês, castelhano… Mais a sério, com tudo explicadinho
que não apenas as fórmulas e soluções rápidas, ficavam nos pesados tomos
guardados nas estantes.
Uma
ocasião tive que fazer um conjunto de fotografias mais complicadas. Implicavam
o uso de anéis de extensão para macro e o uso de flash.
Claro
está que não havia flashes “dedicados”. O mais que havia eram automatismos
incorporados no flash, usando de uma célula foto-sensível, que regulava a
duração do disparo luminoso. No caso esse sistema não se aplicava. E as tabelas
inclusas na unidade também não.
Haveria
que usar de uma fórmula que, não a sabendo eu de cor, era possível de deduzir
do que constava no livrinho que nunca abandonava o meu saco.
Feito
o trabalho e revelado o rolo, constatei que tudo tinha corrido bem.
Mas
não gosto de usar algo que não entenda. Pelo menos os seus rudimentos. Pelo
que, em chegando a casa, fui consultar um daqueles livros de lombada grossa mas
que tudo explicam. E estava lá o que procurava.
Mas
com uma fórmula ligeiramente diferente. O suficiente para que resultado, em a
aplicando, fosse notoriamente diferente. Consultado outro e outro livro,
encontrei mais duas fórmulas, muito parecidas, mas todas diferentes entre si,
com resultados quase tão diferentes quanto o dia da noite.
Chateado
com a situação, decidi inverter a ordem dos factores: deduzir eu a fórmula, a
partir das bases teóricas todas e verificar qual delas a correcta.
Estranho
ou não, acabei por constatar que a do tal livrinho de bolso estava certa. As
demais incorriam no grave erro de serem… gralhas de impressão ou erros de
tradução.
Talvez
que tenha sido esse o dia em que perdi a ingenuidade sobre o conteúdo de
livros, mesmo que técnicos e de valor reconhecido.
De
então para cá, sem que se trate de radicalismos, tenho posto em causa o que vou
lendo, comparando o que encontro com o que eu mesmo sei ou deduzo. E, em caso
de dúvidas ou discrepâncias, procuro confirmações.
Com
o advento da internete e do mundo digital, em que qualquer um publica o que
entende, com ou sem fundamentos, as minhas cautelas são ainda maiores.
Mesmo
que em sites certificados, de reconhecido mérito, o cepticismo sobrepõe-se e
trato de fazer confirmações se algo me parece estranho. E, com o passar dos
tempos e o aumento de certezas que vamos tendo, são cada vez mais as ocasiões
em que encontro escritos que me incomodam. E da certeza do que está no papel
passo à incerteza do pôr em dúvida.
Vem
isto a propósito de um livro em mãos.
Acabei,
há dias, um de Orwell, intitulado “Porque escrevo e outros ensaios”. Encheu-me
as medidas e aprendi algo sobre o que eu mesmo escrevo (e fotografo).
Mas
ter o meu saco de “ir e voltar do trabalho” sem um livro é quase como sair sem
câmara ou caneta. E olhei p’ra pilha dos por ler e peguei num que, cabendo no
saco, me faria saltar dos ensaios em geral para os ensaios sobre imagem em
particular.
Azar
o meu.
Publicado
por editora de prestígio, escrito por autor que não conhecia, parecia-me
apetitoso quando o comprei. E quando o peguei para ler.
Mas
encontrei tanta contradição com o que eu mesmo sei – teorias e técnicas – que
ainda não sei se irei lê-lo até ao fim. Mesmo indo apenas na página 40.
Ter
um livro do qual se desiste a meio é sempre mau. Mas ler um livro que se sabe
estar errado em diversos aspectos…
Não
sei qual das duas situações é pior.
Não
vou referir qual o livro em causa. Para além das questões legais, o autor não
está por perto para contestar a minha opinião.
Saiba-se,
no entanto, que o da imagem está certo em tudo o que nele li e que, em tempos
bem recuados, me safou num momento de aperto em que tive que fazer umas
fotografias macro com flash e… mas já contei isso, creio.
Nota:
saiba-se que a fórmula em causa é esta, usada apenas se empregues tubos ou
foles de extensão:
D
= NG x 100 / f x (ER + 1)
Em
que:
D
– Distância flash/assunto, em centímetros;
NG
– Número guia do flash em metros;
f
– Abertura de diafragma escolhida;
ER
– Escala de reprodução em decimais.
By me
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