Quando
eu era pequeno, comer bolos ou doces fora de casa era coisa rara.
Por
um lado éramos muitos em casa; por outro o orçamento familiar não era de molde
a coexistir com extravagâncias; por fim, não existiam tantos lugares assim,
mesmo na grande cidade, que tivessem os doces apetecidos.
Portanto,
bolos ou doces fora de casa, só em dia de festa ou pela mão de um parente que
tivesse ido sair só com uma ou duas das crianças.
Para
além das cores, aromas e paladares apetecidos, havia algo que me deixava
encantado: o talher.
Só
aquele garfinho especial de bolo, com aquele dente que mais parecia uma
minúscula faca, quando colocado à minha frente fazia-me salivar e arregalar os
olhos: “Vem aí coisa boa!”
Hoje,
é coisa rara de encontrar. Apenas nas chamadas pastelarias finas ou ainda
arreigadas a velhas etiquetas as usam. As demais fornecem ao cliente o mesmo
garfo que, antes de ser lavado, esteve a acompanhar um bife com ovo a cavalo,
regado com uma imperial e rematado com uma torta. O mesmo formato, o mesmo
metal barato, o mesmo baixo custo de utensílios.
Um
destes dias, numa pastelaria da velha guarda e ao pedir ao balcão um bolo de
creme, vi o já idoso empregado a rebuscar a caixa dos talheres mais tempo que o
habitual. Rebuscou, rebuscou e, no fim, encolheu os ombros e entregou-me um
garfo convencional. Os seus olhos não brilhavam.
Este
que aqui vedes, bem como um irmão gémeo que está de fora, foi comprado de
propósito para esta ou outra fotografia. Ainda tive que penar um pouco pelas
lojas de cutelaria até encontrar. A maioria dos empregados desconhecia-os.
Irá,
depois de lavado, para uma daquelas caixas de coisas quase inúteis que por aqui
tenho, servindo de troféu. É que ainda consegui comprar dois antes que sejam
considerados peça de antiquário!
Nota
extra: foi-me difícil fazer esta fotografia, ou melhor, foi-me difícil fazer esta
fotografia antes de “atacar” nas trouxas-de-ovos. Mas, como se constata,
resisti!
By me
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