Ainda sobre sorteios e afins, recupero um artigo assinado
por Fernando Madail e publicado no Diário de Notícias de 10 de Abril de 2005.
E se a qualidade da imagem é bem fracota (consequência de um
péssimo arquivo aqui em casa) já o texto…
À espera que a vaca “Mimosa” borrasse a sorte no jogo de
rifas
Nem as canções da Ágata ou do Toy distraiam os olhares dos
apostadores, virados para as quadrículas desenhadas a branco no campo de
futebol do Grupo Cultural e Desportivo Leões da Citânia, à espera que a vaca
que por ali passeava, com uma faixa do clube, largasse, por três vezes, as
bostas da sorte.
Na solarenga tarde de ontem, demorava até ver quem é que
tinha "tido vaca", isto é, a sorte do excremento cair no quadrado
onde a terra escondia o papel com o número da respectiva rifa, comprada por
cinco euros, para ajudar a diminuir as dívidas do clube da freguesia de Sanfins
(Paços de Ferreira), que foi campeão distrital de amadores na época 2002/2003
e, agora, disputa a I Divisão Distrital da Associação de Futebol do Porto.
"Espero bem que cague no meu número", era o voto mais vezes formulado.
O animal passeava, agitava o rabo, passava a língua pelo
pêlo, deitava-se a descansar... mas tardava a soltar os excrementos que davam
os três prémios, obtidos na ordem inversa da defecação o terceiro ganhava 250
euros e um cabrito, o segundo recebia o dobro do dinheiro mais um porco e o
vencedor (se, até ao fim da noite, a vaca se decidisse) mil euros e um touro.
"Enquanto não lhe chega a vontade de ir à casa de
banho", no meio de uma música do Tony Carreira ou da Mónica Sintra, o
animador da tarde sugeria mais um concurso, oferecendo um prémio pessoal (um
fato de treino da sua fábrica de confecções) a quem acertasse na hora da
primeira borrada bovina.
Entretanto, cruzavam-se miudinhas de tranças e velhas de
luto, chapéus domingueiros e motos de escape livre, bebés de babete e avós de
bengala, casais de namorados e deficientes em cadeiras de rodas. Afinal, foram
vendidos 3 500 bilhetes e a curiosidade de saber em que metro quadrado iria
calhar a sorte, à velha maneira da tômbola de feira ou dos furos de taberna, atraia
a população daquela freguesia de Paços de Ferreira. Até a vereadora da Cultura
se deslocou ao campo de jogos dos Leões da Citânia para apreciar tão
"invulgar espectáculo".
"Não era melhor dar-lhe de comer?", questionava o
presidente do clube ao dono do animal e dirigente dos Leões, que teve a ideia
quando viu uma reportagem na televisão sobre uma iniciativa idêntica. Mais
sucessos musicais de Fernando Correia Marques, do padre José Luís Borga, de
Cândida Branca Flor; o balcão a servir malgas com vinho branco, cerveja em
copos de plástico, carnes assadas nas brasas do lado para meter em pão.
Para passar o tempo, que a Mimosa também não tinha pressa,
alguns jovens jogavam à malha num recinto ao lado do rectângulo destinado ao
futebol, onde se continuava a "esperar que a vaca marque penalty".
Quando os relógios acusavam cinco minutos para as seis da tarde, levantaram a
vaca - que se tinha, entretanto, deitado, alheada da atenção geral -,
arrastaram-na para um balde com ração e, no trajecto, poing!, acertou no número
3405. O filho do presidente da Assembleia Geral do clube acabava de ganhar 250
euros e um cabrito.
Até saírem os outros prémios, as colunas continuariam a
difundir mais canções de Quim Barreiros, Nel Monteiro ou José Malhoa.
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