Estava
cansado, desanimado, chateado. E já era tarde.
Por
isso, e no lugar de subir a pé até casa, desci do comboio e apanhei um táxi. Pequenos
luxos, que a corrida é barata.
Pelo
caminho, ela pediu-nos passagem. Que foi dada, naturalmente.
“Mau!”,
pensei. “Neste caminho não vai levar ninguém: vai buscar.”
“Mau
Maria!”, continuei com os meus botões muito pouco depois. “Então não é que vai
para a minha rua!?”
“Oh
diacho!”, disse agora já em voz alta. “É lá p’ro meu prédio!”
Pararam
onde se vê e, da porta do edifício saiu ao encontro dos três tripulantes uma
senhora que desconhecia. Enervada e atabalhoada, lá tentou contar o que se
passava.
Parou
então um carro, de onde saiu outra senhora que, igualmente enervada,
acrescentou alguns detalhes.
A
pessoa em problemas tinha-lhe enviado uma mensagem onde contava ter cometido
suicídio e pedia que não alarmasse os pais.
Entraram
no prédio e seguiram para o apartamento em causa, já com a disposição de forçar
a porta. Segui para o meu.
Quando,
minutos depois, desci para o registo que se vê, fi-lo na esperança de ninguém
encontrar. Só falhei porque ainda vim a tempo de ver os agentes da PSP que
regressavam ao carro patrulha e se afastavam.
E,
enquanto ia tentando um “boneco” que se visse com a câmara de bolso, regressou à
ambulância um dos tripulantes em busca de uma cadeirinha articulada.
Entendi
que, apesar de grave, não fora fatal.
Não
sei quem é a pessoa em causa. Sei onde mora mas não relaciono cara com local. O
prédio é grande e, com as entradas e saídas de locatários, não é fácil
memorizar todas as referências. E, neste caso particular, não sei se quero.
Os
problemas que levaram aquela pessoa a fazer o que fez (e falhar) já são por
demais grandes para que, mesmo que um só olhar inevitável, venha a ser notada
por isto na rua.
E,
mesmo que me intitule de fotógrafo, não sou abutre a ponto de assim mergulhar
na vida alheia.
É
por estas, e muitas outras não relatadas ou registadas p’los anónimos, que me
chateia até à medula as próximas celebrações da revolução de Abril.
Eu
não quero celebrações! Não na situação em que vivemos! E que leva gente a este
ponto!
Quero
acção!
A
tiro, à paulada, à dentada se for esse o caso, quero que mudemos o rumo que
temos.
E
que casos destes não tenham razão de ser!
Que,
se assim não for, chegaremos ao ponto de já não haver nem ambulâncias nem
tripulantes disponíveis.
By me
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