segunda-feira, 8 de julho de 2013

Tempo de vida



É uma teoria antiga que tenho.
Ainda não me dei ao trabalho de a escrever por completo, porque não só as pesquisas que a consolidem abrangem campos muito variados e que não domino em profundidade, como organizar estas ideias sob a forma de letras sólidas é algo de muito trabalhoso. E preguiça é o meu nome do meio.
Em qualquer dos casos, aqui fica, tão resumida quanto o possível:

A fotografia não é actividade de gente jovem!

Mas, antes que me batam ou me desprezem, leiam toda a argumentação sumária e a própria contra-argumentação.

Se a fotografia é uma forma de comunicação, o órgão sensorial de base é a visão.
Este é o que leva mais tempo a maturar. Não apenas no que aos recém-nascidos diz respeito, que levam semanas e meses a identificar cores, formas, distâncias, como mesmo a chegar ao estado adulto de desenvolvimento biológico e psicológico, atingindo este ponto a partir dos 16/18 anos de idade. Acrescente-se que a sua complexidade orgânica e psico-motora é tal que é a área da medicina que possui maior número de doenças e mal-formações indexadas e que é o órgão sensorial que primeiro perde funções em casos extremos de sobrevivência do individuo.

Por outro lado, a complexidade do ser humano não se satisfez com a efemeridade da comunicação oral ou gestual. Havia que tornar permanentes as mensagens, para suprir as falhas de memória dos retransmissores e para chegar a muitos receptores.
Daí que a oralidade e gestualidade tenham encontrado a materialização, através de suportes e códigos incipientes ou complexos, de entendimento geral ou restrito: A escrita, a pintura, a escultura e, no caso vertente, a fotografia.

Mas acontece que a comunicação não é uma actividade unívoca. Quem comunica espera que a sua mensagem seja recebida e entendida. E, para saber se assim é, espera uma informação de retorno, acusando a recepção e interpretação – o feed-back.
Isto acontece na oralidade, na gestualidade, na música e demais artes de representação ou de palco. O receptor, interlocutor ou público alargado, vêem, ouvem e reagem de imediato. Anuindo ou contestando, aplaudindo ou vaiando. Até a própria ausência de manifestação é uma manifestação!
Nas artes visuais tal não sucede. O suporte de comunicação é trabalhado, em regra, num espaço e tempo íntimos e reservados, e só depois de concluído é exposto ao receptor. E fica, mesmo na ausência do autor, para ser visto, interpretado, apreciado. O feed-back do receptor, a acontecer, é muito posterior à criação da mensagem, criando um hiato bem grande entre os dois momentos.

Por outro lado ainda, a materialização da mensagem implica matéria-prima para a produzir. E conhecer as suas técnicas. E custos na sua obtenção.
Enquanto que a oralidade, a gestualidade e demais formas de comunicação imediatas se podem fazer com recurso a poucos ou nenhuns objectos ou consumíveis (cantar, falar, dançar, assobiar, percutir…) a materialização de mensagens implica papel, tinta, caneta, telas, pedra, cinzéis, câmaras, películas, químicos, arquivos… E todo o que é necessário para os produzir e obter.

Por fim, consideremos que a comunicação gestual ou sonora é também um factor social.
A música, a palavra, a dança junta quem com a forma ou conteúdo se identifica. Por motivos culturais de hábito ou contestação, por interacção social nas relações materiais ou de género, com códigos e manifestações de um-para-todos ou de todos-para-todos, como pode ser um recital, um hino nacional, o baile da paróquia ou uma declaração de amor.
Já a comunicação materializada não é agregadora. Ninguém se junta em torno de quem escreve, pinta ou esculpe. Ou fotografa. Mesmo o usufruto do trabalho final é individual ou muito pouco gregário.

Introduza-se agora o factor idade e juventude!
Os jovens são, por natureza, aprendizes, experimentadores, consumidores rápidos, buscadores de sensações e de identidade individual e colectiva.
Durante a infância e juventude, o ser humano está a aprender as regras e códigos da sua sociedade, quer se trate das interpessoais ou técnicas e práticas de produção e sobrevivência. Numa primeira fase da vida segue exemplos, numa segunda contesta-os, procurando a sua própria forma de ser e estar.
E porque a sociedade é complexa nas suas interacções e tecnologias, estas experiências passam por inúmeros falhanços e algumas vitórias pelo caminho. Assim, há que ir experimentando para alterar esta relação, aumentando o número de satisfações e reduzindo as insatisfações.
Na comunicação, em que o feed-back é vital para a obtenção da satisfação, os processos morosos e de retorno tardio não são os mais recompensadores. Este atraso redunda em insatisfação e é dela que o jovem foge.

É assim, por tudo o enunciado, que vamos encontrar a maioria – a grande maioria – dos jovens envolvidos em processos de comunicação imediata, com um atraso no feed-back pequeno ou nulo, quer seja enquanto consumidores ou enquanto produtores de mensagens: a comunicação sonora ou gestual.
Todos eles passam, até porque faz parte do processo de aprendizagem socialmente instituída, pela materialização da comunicação. Aprendem a escrever e ler, desenhar e esculpir e também a fotografar.
Mas acabam por as abandonar, pelo timing do feed-back, pela tardia maturação do órgão sensorial e processos associados, pelos custos da matéria-prima, por não servir como acto social.

É evidente que alguns há que se mantêm como utilizadores destes processos.
Porque encontraram satisfação na actividade, porque são precoces, porque têm acesso aos meios de produção ou por não necessitarem de uma afirmação social e pessoal do mesmo cariz dos demais do seu grupo etário. Mas são poucos!

Nos tempos que correm, na chamada “sociedade de informação”, as coisas estão a mudar!
A facilidade de produção da comunicação materializada – no caso da fotografia, a digital e o custo zero na produção de imagens -, a rapidez e imediatismo na produção e exibição das imagens – internet, telemóveis -, o facto de ser novidade e moda – o que define grupos de identificação e, de alguma forma, de contestação à geração anterior – faz com que cada vez mais jovens usem a fotografia como forma de expressão e comunicação.
Em tentativas mais ou menos “artísticas” (o que quer que isso seja), apenas porque apetece fazer ou porque apetece mostrar, o fazer da fotografia é agora fácil, rápido, de feed-back quase imediato e de satisfação bem mais atingível.

Esta nova geração da informação e digital produzirá, espero eu, um muito maior número de fotógrafos/comunicadores de qualidade.
Assim tenham a oportunidade de o tentarem, errarem, satisfazerem-se e aprenderem. E pensarem em profundidade no que produzem e comunicam.

E isto depende, em regra, de um factor não tecnologicamente modificável: tempo de vida!

By me

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