terça-feira, 18 de agosto de 2015

A soca



Faz tempo que não encontro sapatos abandonados na rua.
Não sei se há menos deitados fora, se os serviços de limpeza passam antes de mim ou se sou eu que perdi a mão ou o olho para dar com eles.
Mas deu-me a saudade de os encontrar.
Vai daí, decidi ir dar um pequeno passeio no extremo do meu bairro.
Há por lá um terreno que, por enquanto, ainda é um baldio, com um charco onde nidificam patos selvagens e arruamentos de terra batida ainda.
Entre ele e os últimos prédios, há aquilo que seria um parque infanto-juvenil, com espaço de jogos, de skates e biclas, e onde as mamãs levam os pimpolhos, pelo seu pé ou no carrinho, para aproveitar o fim do dia. Os mais velhinhos, a essa hora já por lá estão, jogando bola ou apenas sentados à conversa. Elas para um lado, eles para outro, alguns pares ensaiando o futuro.
Naquilo que seria o ajardinado e que, regra geral, mais não é que ervas crescidas de permeio com algum lixo escasso, costumo encontrar um ou dois sapatos, bastando para tal caminhar com calma e olho atento. Não foi o caso de hoje.
Os funcionários camarários andaram por ali e limparam tudo: ervas e lixo, deixando o que parece ser a promessa de relva. Pelo menos o terreno está tratado.
Azar o meu que, para encontrar o que procurava, tive que avançar pelo baldio, ervas e mato e percorrendo os trilhos ali existentes, de permeio com os que ao fim do dia ali vão correr, para encontrar este exemplar.
Veio para casa na câmara, pendurada no ombro, qual troféu de caça.

E veio também a memória de uma conversa entre-ouvida enquanto abordava um tronco carcomido pelo fogo e navalhas de garotos. Conversavam nem sei sobre o quê, quando uma voz feminina se fez ouvir mais alto:
“Oh Fábio! A seguir a Agosto, que mês vem?”
“Outubro, acho eu.” Foi a resposta.
Espreitei por cima da objectiva, pequena que é a 50mm, e confirmei o que sabia: rondavam os 14/15 anos, eles e elas.

Que raio aprendem eles na escola?

By me 

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