terça-feira, 19 de agosto de 2014

Fotógrafo



Parece que hoje é o dia mundial da fotografia.
Não sou lá grande entusiasta dos “dias mundiais de…” Fico sempre com aquela sensação de que só aquele dia é que conta, seja lá para o que for, ficando os outros dias reservados para trivialidades. Como o natal e a solidariedade.
No meu caso a fotografia faz parte do quotidiano.
Seja como for, este é o dia. E, para além do boneco, deixo-vos com uma histórinha, velha de umas dezenas de anos.

Gravava eu Macbeth.
Tratava-se da transposição para estúdio da versão de palco de uma encenação peculiar. Sendo que o realizador fora o encenador, a adaptação era fácil e fiel. E, segundo ele nos explicou, procurara que fosse também fiel às encenações originais no tocante a marcações de cena e cenários. Tal como a planificação e iluminação.
Foi um daqueles trabalhos que, mesmo não tendo tido grande sucesso junto do público, mais gozo me deu fazer e em que muito aprendi. Sobre teatro, sobre Shakespeare, sobre o meu ofício.
E sobre fotografia.

No segundo (ou terceiro) dia de gravações, veio um fotógrafo fazer as fotografias de cena. Normal.
O que era menos comum era ele ser britânico. O que por cá se fazia não merecia esse tipo de atenções. Mas, talvez, por ser a peça que era, do autor que era, com a encenação que era…
Trabalhava ele com uma câmara SLR de médio formato. Não garanto já se seria uma Bronica se uma Hasselblad. Talvez que Bronica, que tenho uma vaga lembrança de a câmara ser preta. Pouco comum, ver este tipo de câmara a trabalhar num estúdio que não de fotografia. Pelo menos neste cantinho, onde a fotografia não tinha (não tem) grande impacto.
O que era realmente raro, único para mim e até hoje, é que ele, o fotógrafo, não tinha o braço esquerdo. Apenas um coto.
A câmara possuía motor, tinha um punho por baixo, e era assim que ele a usava. Era pendurada no pescoço que ele ajustava o foco, era pendurada no pescoço que ele mudava o rolo, era pendurada no pescoço que ele mudava de objectiva (usava duas) e tudo feito apenas com uma mão e com uma facilidade e naturalidade que me deixou de boca aberta.
A ponto de ainda hoje, passados todos estes anos, me recordar vivamente do que vi então.

Não sei em que circunstâncias perdeu ele o braço. Se antes ou depois de começar a fotografar. Mas não tenho dúvidas que a sua paixão pelo seu trabalho não deixava que uma coisa “menor” como o não ter um braço o impedisse de fazer aquilo que queria e de que gostava: fotografia.

No dia mundial da fotografia fica o recado àqueles que, a torto e a direito, se queixam de tudo: do tempo, da luz, das dores, da falta de condições, da falta daquela peça de equipamento, da falta de assunto…

Fotografia faz-se não importa como, quando, onde ou o quê. Basta querer!

By me

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