Foi
há oito anos.
Um
dia, de manhã, soube que tinha falecido Artur Ramos.
A
esmagadora maioria de quem lê estas linhas não saberá quem foi. Mas foi o
primeiro realizador de televisão em Portugal. E foi realizador de cinema, cá e
lá fora. E foi encenador de teatro. E foi ensaísta. E foi actor. E foi tradutor.
E foi crítico de teatro. E foi…
Foi
uma série de coisas no panorama cultural português, trabalhando bem mais nos
bastidores que na ribalta. E, em todas elas, foi muito bom.
Tive
eu o especial privilégio de com ele ter trabalhado por diversas vezes e de por
ele ter muito respeito e admiração. Como profissional e como pessoa.
Assim,
e em sabendo da sua morte, mesmo que já estivesse retirado do activo que tinha
oitenta anos, tratei de passar o facto a quem poderia divulga-lo.
Afinal,
e para além de tudo o que tinha feito, sempre tinha sido um “dos nossos”.
Foi
difícil. Foi mesmo muito difícil. Foi quase que bater contra uma parede. E eu
conheço os meandros! Argumentos vários, desculpas esfarrapadas, e ninguém
queria pegar no assunto.
Acabei
por recorrer a “artilharia pesada”, que é como quem diz: a contactar gente de
peso para que usassem da sua influência. E a notícia lá acabou por ser dada: um
dos grandes do panorama cultural e audiovisual de Portugal tinha falecido.
Não
sou grande admirador de obituários. Afinal, a vida de cada um ao próprio
pertence. O que possa ser de interesse para os outros, e para além das
afectividades, é o trabalho que fez, a herança que nos chega. De bom ou de mau.
Mas
a herança deste é grande, o seu trabalho e pensar foi notório, pelo que me
ficou a fazer cócegas o porquê da dificuldade, da obstrução.
Só
um bom tempo depois, uma semana talvez, me apercebi do porquê:
Ele
fora membro do PCP. E pagara-o caro, antes e depois da revolução. Nunca fora
figura destacada, ao que sei, dentro do partido e não me recordo de ver referências
a tal nos jornais. Tal como, e durante o muito que trabalhámos juntos, isso nunca
foi um pró ou um contra. Era-o e bastava.
Mas
há coisas que não se esquecem, que ficam marcadas para todo o sempre. Um
estigma que fica para além da morte, como que um número tatuado num braço.
Recordo
este episódio, que mais não foi que um episódio, e comparo-o com o que hoje mesmo
acontece: a morte de um notável no panorama cultural português com a morte de alguém
que ninguém conhecia mas que era familiar de alguém conhecido.
E
comparo o mediatismo de um e outro falecimento. E comparo o que um e outro
deixaram a todos nós, portugueses. Não comparo, naturalmente, a dor dos que
lhes eram próximos, que essa não tem comparação. Mas comparo vidas e
mediatismos.
As
conclusões que tiro guardo-as para mim. Afinal, em momentos de luto, convém ser
comedido.
By me
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