segunda-feira, 2 de maio de 2011

Saber em pó



Um dos problemas da actual sociedade de informação é ela mesma: a informação!
Quer seja através dos meios convencionais quer seja através das novas tecnologias, temos todos os dias mais informação, acesso a mais conhecimento. Em variedade e profundidade.
Mas esta é também a sociedade de consumo. Há que consumir mais e mais, que assim somos levados pelas campanhas de marketing e pela definição de status social.
E quando misturamos conhecimento com consumo o resultado da fórmula redunda em superficialidade. Não há tempo para aprofundar o conhecimento em tantas e tão várias áreas. E fica-se pela superfície.

Exemplificando, e forçando um pouco a nota:
Depois de se ler um artigo de 300 palavras sobre física nuclear, passa-se a outro sobre botânica, seguindo-se direito internacional, motores de combustão interna, culinária e termina-se a manhã com economia.
E, depois de os ler, fica-se com a sensação de “saber” sobre a matéria. Não nos damos ao trabalho de questionar as ideias lidas, que isso levaria a procurar outras leituras e autores, a aprofundar o sentido de cada palavra, frase ou conceito. E, em chegando ao fim da manhã, não teríamos passado, talvez, de meio do primeiro artigo. Com sorte!
E, quando mais tarde, em torno de uma imperial vespertina no café ou de uma bica na cantina, passaríamos por ignorantes. Saberíamos alguma coisa de um tema, mas os outros passar-nos-iam ao lado. Que vergonha social, não se saber nada de tantos assuntos!

Mas, tão ou mais grave que este consumismo de conhecimento, com fórmulas instantâneas de saber, é não só a falta de curiosidade de quem consome como a superficialidade dos meios onde se consome. São os artigos breves, os guias práticos, o saber para totós. Que entopem quiosques, livrarias, grandes superfícies e páginas web.
E esta super-abundância de conhecimento por atacado, de incentivo à superficialidade do saber, transforma-nos em idiotas doutores, que tudo sabemos sobre coisa nenhuma e que nada sabemos sobre tudo.
E como as fontes são semelhantes, tipificadas, minimalistas, quando se ventilam ideias, se trocam opiniões, os pressupostos são os mesmos: as mesmas origens, as mesmas superficialidades. E o resultado é nulo!
Os argumentos apresentados nas conversas são os mesmos, baseados nas opiniões de outrem, sem que os próprios tenham tido perguntas para as quais tenham procurado respostas. Em existindo discordâncias de opiniões, a profundidade com que os assuntos são sabidos é tão pequena, que pouco mais podem fazer os oponentes que recorrer a chavões e frases feitas, porque lidas no guia prático ou no suplemento dominical.
E, ao sair-se do café ou ao fechar-se o chat, fica-se satisfeito consigo mesmo porque se demonstrou saber e decepcionado com o vizinho ou colega, que não entendeu a frase linda e bem sonante que ouviu e que, prazenteiramente, lhe dissemos.
E, desta “Conversa da Treta”, que lucraram os interlocutores? Nada, para além do convívio e do alimento do ego.

Vem toda esta algaraviada a propósito de uma pergunta que me foi feita num blog: “Quantas pessoas pensas tu que lêem os teus textos até ao fim?”
Sei que são algumas. Não muitas, mas algumas.
Que, da mesma forma que procuro que aquilo que vou aprendendo seja algo mais que o conteúdo de um guia prático e, de preferência, com mais de 300 palavras, também tento que as minhas argumentações não se fiquem só pela rama.
Que frases feitas há-as nos dicionários humorísticos e conhecimento em pó suspeito que em supermercados e, certamente, em instituições de ensino por atacado.

Texto e imagem: by me

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