sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Diatribes sobre cor



Em tempos já distantes, quando o digital era só a ponta do dedo, eu carregava um montão de filtros comigo.
Na verdade, tinha dois montões de filtros, diferentes: um específico para fotografia em preto e branco, o outro para cor. Mesmo que alguns fossem comuns a um e outro tipo de imagem.
Sabemos – ou pelo menos sabem aqueles que fotografam ou fotografaram em película e em preto e branco – a vantagem dos filtros: controlo de contraste.
E era – é – fácil saber se o fotógrafo está a usar película monocromática: costumam ter sempre um filtro amarelo ou verde pálido montado, mesmo que não tenham muitas certezas da sua finalidade. Por vezes mesmo o laranja.

Em termos de fotografia em cor – e fotografava sempre em diapositivo – as séries “80” andavam sempre comigo: os 81’s e 82’s, bem como o 80a, 80b, 85a e 85b. E um sépia muito pálido, que foi difícil de encontrar. Tal como os “FL”, “d” ou “w”.
A finalidade era simples.
Pese embora que o rigor da fidelidade da cor registada fosse importante em alguns trabalhos – pessoais ou encomendas – o que me importava era a subjectividade da cor resultante. A película estava calibrada para uma dada sensibilidade cromática (em regra para luz de dia ou 5500 Kelvin) mas eu sempre quis que as cores resultantes fossem as que sentia ao olhar para o assunto e não a frieza da física e da química. Aquecer ou esfriar a imagem de acordo com os sentimentos, para além do que realmente acontecia.
É um clássico dizer-se que um retrato feminino deverá ser “aquecido” e que um masculino deverá ser “arrefecido”. Estereotipos sobre o género que demasiadas vezes não batem certo. Tal como sobre paisagens rurais ou citadinas, objectos ou mesmo abstractos.
A cor está intimamente relacionada com os sentimentos, mesmo para além do balanço verde/azul. E se a imagem que produzo é, também, um reflexo dos meus sentimentos, então ela deverá lá estar expressa. Mesmo que em doses subtis.
Nos tempos que correm a coisa tornou-se mais fácil e mais difícil ao mesmo tempo.
Mais fácil, já que a calibração da sensibilidade cromática no momento do disparo é facílima: dois ou três cliques num qualquer menu e está feita. Quer se trate da fidelidade à fonte de luz que ilumina o assunto, quer se trate à subjectividade das nossas emoções.
Mais difícil porque a pós-produção permite tudo e mais um par de botas. Todas as cores podem ser evidenciadas ou minoradas, de acordo com as vontades sentidas em frente do ecrã. E, por vezes, a vontade é grande.
A questão está, as mais das vezes, em se aquilo que se altera umas horas valentes depois (dias mesmo) da tomada de vista corresponde ao que se sentiu ao premir o obturador. Muitas vezes não.
Quer seja porque já dormimos entretanto, quer seja porque depois da tomada de vista, e ainda no local, vimos ou sentimos diferente, quer seja porque a calibração do monitor e as luzes de trabalho nos induzem em erro… São muitas as variáveis na pós-produção ou edição.

A minha abordagem costuma ser constante, no que toca a subjectividades.
Tal como decido, no momento de enquadrar, qual vai ser o enquadramento final, já que o formato da câmara não me agrada, também costumo decidir da cor: se a forma como tenho a câmara calibrada é suficiente ou se terei que fazer correcções ou alterações posteriormente. Ou ajustes de contraste ou saturação.
Estas decisões passam por pensar, mesmo antes de levar a câmara à cara, sobre o que me atraiu ou incomodou. Por vezes fico uns minutos a olhar para o assunto, tentando perceber e relacionar o que estou a ver e a sentir. Outras é de imediato, sem hesitações.
Estes ajustes, pequeníssimos por vezes, de fundo outras, nem sempre são fáceis.
Implicam, por exemplo, lembrar-se de qual das câmaras estou a usar no momento. Uso com regularidade uma Pentax K7, DSLR, e uma Nikon Coolpix 7000. E por muito que os fabricantes se esforcem, os resultados são diferentes no que toca a subtilezas de cor e contraste.

Conhecer o que se tem na mão, imaginar o resultado final, conhecer o ou os monitores com que se trabalha, torna-se vital neste processo. Tal como  interpretar as nossas próprias emoções e perceber como as transpor para o registo fotónico final.

By me

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