sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Testemunhos



Antigamente eram os autógrafos. Conheci gente que nunca largava o livrinho de autógrafos, com o qual importunava quem quer que fosse famoso para nele deixar a sua rubrica.
Na mesma categoria ficam os livros autografados. Há quem não perca uma oportunidade de conseguir um livro autografado. E se com dedicatória então… perfeito. Claro que autores, editores e livreiros aplaudem o gesto, que a cada autógrafo é um exemplar que se vende.
A moda, hoje, é outra: selfies!
Quem quer que queira ser alguém tem que ter uma selfie com algum famoso, alguém que admire. Depois… bem, depois é divulgar a respectiva nas redes sociais ou tê-la sempre à mão no smartphone actual. É-se alguém, hoje em dia, se se for visto com alguém famoso. A fama dele escorre para nós através da tinta da caneta ou dos fotões registados.
Não tenho fome da fama dos outros. E não tenho testemunhos de com eles ter estado ou interagido.
Talvez porque, e desde que me conheço, vou lidando com o fabrico de testemunhos, escritos ou fotográficos. E porque, por isso mesmo, sei como são fúteis. Ou falsificáveis.
Talvez porque entendo que os momentos memoráveis na presença de grandes, realmente grande, são mais para serem vividos que para serem testemunhados. Afinal, a fama e a glória é deles e não minha.
Talvez porque por perto já passaram tanto e tantos grandes e Grandes que já lhes perdi a conta. Uns das artes e das letras, outros da política, outros da religião, outros do desporto… alguns vieram ter onde eu estava, outros fui eu ter com eles, num mecanismo de vantagem recíproca.
Mas, e essa será a principal razão, porque entendo que não preciso de testemunhos materiais para provar a terceiros as minhas próprias memórias ou vivências. Que se a minha palavra não for suficiente, então não adiantará contar o que quer que seja, seja com que testemunhos forem. Que aquilo que tenho verdade é-o, acreditem ou não.
Foi verdade, e sem documentos que o demonstrem, que agredi uma grada figura da nação. Não foi propositado, mas aconteceu, tornando-me, provavelmente, no único profissional da área a fazê-lo e ficar inteiro para o contar.
Também foi verdade que uma grada figura do mundo do espectáculo me deve a vida. Não gosto dele, foi um gesto instintivo o premir do botão, mas aconteceu. Mesmo que ele não goste que se conte a história.
Mas o ponto alto, do qual não tenho testemunhos materiais, foi ter estado com gente realmente Grande. Ao mesmo tempo, em frente da minha objectiva e por mais de uma hora, Sebastião Salgado, Chico Buarque e José Saramago. Mais que testemunhos, sobra-me a recordação de me ter sentido tão pequenino junto daqueles três gigantes.
E se bem que aqui possa partilhar destas histórias, mesmo que sem provas documentais, o mais importante foi o tê-las vivido. Estas e outras. À medida do ofício e das oportunidades, tal como todos têm à sua própria medida e igualmente importantes.
Testemunhos? Nah! Bem sei como se fazem ou fazem de conta que fazem. E se eu não acreditar em quem mo conta, não serão testemunhos que me farão mudar de opinião.


By me

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