terça-feira, 1 de abril de 2008

Linhas cruzadas


Não havia telemóveis. Existiam os Bip’s, para os que queriam estar sempre em movimento e os atendedores de chamadas para os que queriam estar na vanguarda mas sem traquitanas penduradas no cinto.
E eu alinhei na moda.

A minha mania era brincar com quem me telefonasse, com atendimentos menos comuns.
Do estilo “Não vale a pena falar, que deste lado só existem surdos”, ou “Ah, é você! Não sei se quero falar consigo, mas vá dizendo coisas que eu logo vejo!” ou ainda “Vá falando, mas bem alto que eu estou do outro lado da casa.” Estas e muitas outras eram acompanhadas de música de fundo variada ou mesmo apenas efeitos sonoros.

A partir de dada altura, passei a receber mensagens de quem não conhecia. Vozes femininas iam brincando com os meus atendimentos automáticos, dando uma aura de mistério à coisa e levando-me a criar mensagens de resposta às suas provocações. O jogo durou ainda uns meses. Uma paródia!
Comentário daqui, pista dali, provocação dacoli, entremeado com algum trabalho e investigação digno de Sherlock Holmes, e acabei por dar com elas, que eram duas. Na zona de Almada.A brincadeira transformou-se num divertido almoço ali para os lados de Cacilhas.

Conversa vai, conversa vem e constato a seguinte coincidência:Uma das senhoras, da minha idade, tinha imigrado cedo para a Austrália, onde tinha casado. As coisas não correram tão bem quanto o desejado e foi obrigada a regressar, tendo arranjado aquele emprego em Telemarketing. Felizmente tinha endireitado a sua vida, casado de novo e já com filhos, pelo que estava tudo mais ou menos bem.
No entanto a sua meninice fora passada em Lagos e, por acasos da sorte, tínhamos brincado juntos durante as minhas férias de verão, ainda antes dos nossos dez anitos. Havia uns decénios.

As linhas da vida que formam um padrão, têm por vezes secantes que tudo atravessam.
São elas que nos abrem os sorrisos!

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