terça-feira, 4 de junho de 2013

Sobrevivência



Esta é uma história de sobrevivência. Ou de teimosia, se preferirem.
Há oito meses que esta sandália jaz na linha de caminho-de-ferro. Na estação do meu bairro.
Começou por estar orgulhosa e imaculadamente colorida bem no meio dos carris e, por via das deslocações de ar dos comboios que não param ou empurrada para o lado por quem vai limpando o local, foi-se chegando, chegando, chegando, até atingir o limite do movimento possível: encostada à parede.
Começam agora as ervas a crescer-lhe em redor e a ficar coberta pelos demais resíduos que por aqui vão surgindo.
E eu, caçador fotográfico de uma espécie em vias de extinção (sapatos abandonados na rua) não consigo deixar de para aqui olhar de cada vez que subo a cais. Ou seja, todos os dias. Sempre na expectativa de saber se esta minha amiga conseguiu sobreviver mais um dia, à revelia das limpezas de via e das intempéries.

Quando o curso normal da vida suburbana nos afastar de vez terei pena. Que o fim de um sobrevivente é o prenúncio do fim de algum outro.

By me 

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