quarta-feira, 19 de março de 2008

Manifesto mal-amanhado


A liberdade é dos bens mais preciosos da humanidade. E é tão caro ao Homem (e aos restantes seres vivos, diga-se de passagem) que a civilização usa a sua privação como forma de punição aos códigos sociais.
Mas o conceito de liberdade é vasto e abrangente. Para uns poderá ser o movimentar-se sem restrições, para outros o poder criar e desenvolver empreendimentos, para outros o pensar e o falar.
E a ausência de liberdade sempre foi um mal combatido na história. A rebeldia dos povos contra autocratas e ditadores, o recurso a secretismos para escapar a esbirros políticos ou religiosos, o sangue derramado por essa bandeira sem cor nem pátria.
Alguns foram os que entenderam ser seu dever levar esse conceito a todo o mundo e o fizeram. Para dar apenas dois exemplos, Garibaldi e Che Guevara.
No entanto, e por muito nobres que fossem – e eram – os seus ideais, incorreram num erro crasso, hoje repetido: entenderam que o seu conceito de liberdade e a forma de o implantar seriam universais e que todas as sociedades deveriam por ele estar abrangidos. E, no momento em que assim pensaram e agiram foram tão autocratas quanto os naturais dessas sociedades que aos seus irmãos de região impunham a sua privação. Os conceitos sociais variam de zona para zona e de tempo para tempo e não haverá, forçosamente, nem fórmulas universais nem que impor um pensamento a quem não o tem. Tal como não se deve proibir de o ter. Esta é a verdadeira essência de Liberdade.

Por mim, que não sou nem genial nem altruísta para além do limite, entendo que a defesa que devo e posso fazer da Liberdade se restringe à minha área de influência, à sociedade em que me insiro. Junto daqueles que, de alguma forma, se regem por um mesmo conjunto de códigos de sociedade e culturais, onde a minha forma de intervenção pode e deve ser útil. Fazendo com que os meus pontos de vista, mais que serem aceites, possam ser conhecidos. E que cada um, fazendo uso da sua liberdade de acção e pensamento, possa optar pelas condutas que melhor lhe agradem. Passando sempre pelo respeito das liberdades dos restantes.
Claro que este exercício da Liberdade trás sempre amargos de boca. Por parte do exercício do poder governamental, policial, partidário ou laboral. Até mesmo cultural. Há sempre quem goste, queira e possa exercer a autocracia, tentando silenciar aqueles que a denunciam em público. Tenho tido a minha quota-parte e cicatrizes por actuar contra estes actos censórios e restringidores da Liberdade. Mas não é por isso que o deixarei de o fazer e a exercer!
Mas é complicado divulgar ideias e praticar a Liberdade no seio de sociedades que, sabendo-se privadas dela e conscientes da sua existência, nada fazem por ela, em que cada elemento se refugia no seu próprio micro-cosmos, fazendo por ignorar o macro em que se insere. E, com este alhear do que rodeia e, em simultâneo, alijar de responsabilidades, dar espaço de manobra alargado aos títeres e autocratas, de grande ou pequeno calibre, que fazem da sua ditadura a sublimação das suas frustrações pessoais.

É assim que prefiro fazer ouvir a minha voz onde existo na realidade, na sociedade em que estou inserido e que entendo por dentro, deixando as virtualidades das intervenções para aqueles que, ao contrário de mim, querem e sabem agir para além fronteiras e onde não são bem-vindos. E que assumem o risco de, por tanto querem divulgar a Liberdade, acabarem por a impor, impedindo-a.
Até porque, de que adianta querer arrumar a casa dos outros quando a nossa própria está caótica?

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