sábado, 24 de dezembro de 2016

Fedon



O meu tio Artur era uma figura impar.
A sua vida daria um belo romance de amor. Talvez um destes dias aqui volte a falar nele.
Tinha ele uma atitude extremamente positiva para com quem o cercava.
Quando o visitava, havia sempre uma caixa enooooorme de chocolates suíços, onde a minha dúvida era na escolha por entre aquelas fotografias de paisagens alpinas que nos deliciavam os olhos e a boca.
Possuía uma agenda bem grande, daquelas de secretária e que todos os anos laboriosamente era copiada para uma nova, onde tinha anotado os aniversários de todas as pessoas que conhecia, parentes ou não. Diariamente, antes de sair de casa, consultava-a, tomava apontamentos e passava pelos correios afim de enviar aos aniversariantes um telegrama de parabéns. Mesmo que já não visse ou falasse com a pessoa há muitos anos.
Era meu tio-avô, pelo que, quando o conheci, tinha já uma idade provecta.
Uma ocasião, era eu catraio miúdo, fui lá casa com minha mãe.
Ele estava bastante doente, já acamado. Já não sei se ideia dele se de minha mãe, certo é que se quis fazer-lhe uma fotografia.
A dobra do lençol foi arranjada, assim como a almofada, a gola do pijama e os alvos cabelos.
Junto aos pés da cama, minha mãe levou a câmara à cara e enquadrou. No instante imediatamente antes do disparo, meu tio Artur levantou a mão direita e encenou um adeus, sorrindo. Que ficou na imagem latente e, mais tarde, positivado.
Foi a sua última fotografia. Faleceu no dia seguinte.
Aquele homem, com uma vida riquíssima de peripécias e amigos, sabia que estava a chegar ao fim desta sua viagem. E quis mandar uma mensagem de despedida para todos.
Através da magia da fotografia quis despedir-se sorrindo, mesmo que não viessem a ver o seu adeus.
Ainda hoje revejo na memória o fazer dessa imagem. Que não possuo, mas que foi uma das minhas chaves para este mundo maravilhoso da comunicação.


Obrigado tio Artur!

By me

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