Uma ocasião, de
conversa com dois ex-legionários em França, questionei-os sobre o que faz alguém
ir para organização, ficando com a morte como ofício.
Não me responderam
e eu, que pouco mais que adolescente era, insisti na questão. Um deles calou-me
com a resposta:
“Não tinha casa, não
tinha dinheiro, não tinha família. Fui encontrar tudo isso na Legião”. E o
nosso almoço partilhado continuou, eles comendo dos meus pêssegos comprados ali
ao lado na feira, eu bebendo do seu vinho de uma bexiga.
Se fosse hoje, e não
há umas dezenas de anos, teria sido diferente: a partilha teria acontecido na mesma,
mas nem eu teria ficado calado nem a minha pergunta teria sido feita daquela
forma.
Que se há coisa
que aprendi nos tombos da vida e das ampulhetas é que a proximidade e a
segurança não são resultado obrigatório de laços de sangue ou de genes.
Os afectos, a
chamada “família”, resultam de cumplicidades estranhas, por vezes insuspeitas,
construídas em poucos minutos ou ao longo de uma vida, na sequência de momentos
particularmente intensos ou na doçura de uma continuidade tranquila.
Os afectos ou a
organização familiar não dependem, em nenhuma circunstância, de arquivos de
conservatórias ou decisões judiciais.
As rotinas e a
mole evolução temporal podem criar essa ilusão, mas são os momentos complexos,
os mais duros, que definem a solidez das relações.
A todos aqueles
que nunca tiveram a real necessidade de provar a robustez daquilo que têm por
garantido, as minhas felicitações e desejos que nunca tenham que o fazer.
By me
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