A farmácia estava
cheia. Quando chegou a minha vez, pedi um banal “Aspergic”. Cá em casa a época
das constipações já começou e eu já perdi duas narinas para ganhar duas
torneiras. Escancaradas.
Não tinha receita,
que nestas coisas não faz falta, nem quis o saquinho de papel onde quiseram
colocar a caixa.
“Para que me vai
dar isso se daqui a pouco, em tendo oportunidade, o deitarei fora? Só para
fazer lixo?”
O tom foi
suficientemente alto para que o cliente a meu lado ouvisse e esboçasse um
sorriso. Vi-o pelo canto do olho, ao mesmo tempo que esperava a pergunta da
praxe:
“E quer número de
contribuinte na factura?”
“Olhe! A senhora não
tem idade para isso. Mas se tivesse andado a fugir a uma polícia política não
propunha isso!”
E acrescentei:
“Eu sei que tem
que fazer a pergunta, mas eu tenho que passar o recado!”
O meu tom foi um tudo
ou nada alto. O suficiente para sentir que as mãos paravam e as cabeças se
viravam, nos diversos pontos de atendimento. Não por muito tempo, que o
discurso foi curto, mas o suficiente para que o recado chegasse a mais de duas
dúzias de orelhas.
À minha frente, a
trintona de bata branca sorriu sem saber muito bem o que responder. Limitou-se
a aceitar o meu dinheiro e dar-me o troco, que a caixa com o medicamento já
estava na mochila.
Intervir na
sociedade não passa apenas por actos eleitorais, cumprir ou redigir códigos
civis ou fiscais ou desfilar em manifestações.
Intervir na
sociedade é, acima de tudo, fazer passar mensagens, quer pelo discurso, quer
pelo exemplo. E quanto mais insuspeito for o local e mais anónimo se for, mais
facilmente a mensagem passa.
Se será ou não
entendida ou seguida, isso já é outra questão.
By me
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