Teria
eu algures entre os 16 e os 17 anos. Estudante liceal, em pleno período pós
revolucionário.
Em
saindo do liceu, umas esquinas depois, encontro uma mulher sentada sozinha no
murete de uma boca de metro. Chorava. Muito.
Abeirei-me
e perguntei-lhe se a poderia ajudar.
Por
entre as lágrimas que lhe escorriam da cara e tombavam na sua roupa modesta,
disse-me que não, que estava cheia de dores.
Uma
mulher que chora de dores precisa de ajuda certamente e propus-lhe o chamar de
uma ambulância.
Assustou-se
e disse-me que não, que seria presa. Tinha acabado de fazer um aborto
clandestino.
Que
poderia eu fazer, adolescente com uma vivência bem diferente da que hoje se tem
com esta idade? Contando os poucos trocos da minha semanada, sugeri-lhe levá-la
a casa de táxi. Aceitou.
Deixei-a
à porta do seu apartamento, no cimo de umas escadas esconsas e escuras, ali
para os lados de Santa Apolónia. A seu pedido, desci em busca de uma mulher sua
conhecida, ali num tasco ou mercearia, já não sei ao certo.
Nunca
mais soube nada dela, nem teria que saber.
O
epílogo desta história aconteceu há pouco mais de um ano, em que descobri o prédio,
em recuperação antes do desabar final.
Adolescente
ainda, fiz uma jura interior, solene e inquebrável: em tudo o que puder,
nenhuma outra mulher passará por isto!
Ontem
fiquei a saber que, no Brasil, se prepara para ser aprovado o “estatuto do
nascituro”, em que a prática do aborto passará a ser proibida na íntegra, mesmo
que em casos de violação ou má-formação congénita e morte anunciada pós parto.
Mais,
ficam os violadores obrigados a manter um vínculo para com a vítima, através do
pagamento de uma pensão para a criança até à maioridade. E, se o violador não
for identificado, o estado assume essa responsabilidade.
Estarem
os Brasileiros na rua não se prende apenas com vinte cêntimos ou jogos de bola.
By me
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