Quando
saio a fotografar uma manifestação há um assunto, óbvio, que prende a minha
atenção: a manifestação por si mesma.
As
pessoas, os comportamentos, os protestos e as suas razões, cartazes, humores,
acções… a manifestação.
Estou
em crer que a esmagadora maioria de quem ali vai com uma câmara vai com a mesma
intenção.
Mas
dois outros assuntos vão prendendo o meu olhar, por vezes rivalizando seriamente
com o principal.
Um
deles são olhares. O meu projecto, que creio ser sem fim, de ir registando
olhares, só olhares, faz com que vá reparando nos que estão, procurando os que
me prendam a atenção, por este ou aquele motivo, e tentando antecipar a
facilidade ou o seu oposto em conseguir a fotografia. Claro que há sempre
algumas fórmulas de abordagem para algo tão intrusivo quanto uma potente
objectiva a pouca distância e apontada aos olhos. O alimentar o ego com um
elogio é uma delas. Mas sempre se pode improvisar.
Um
destes dias, e vendo duas senhoras jovens com um cão, recorri a uma piada, mais
que velha, mas que serviu para quebrar o gelo:
“Desculpe,
mas… morde?”
“Eh…
Não!”
“Ah!
E o cão?”
A
partir daqui, e pedindo desculpa pela vetusdade da abordagem, consegui o que
queria, entre algumas gargalhadas a três.
Mas
um outro tema me faz olhar com olhos de ver quem está: pessoas que transportem
câmaras fotográficas.
Procuro,
cada vez com mais insucesso, câmaras Pentax nas ruas. E, quando encontro alguém,
trato de registar o momento após dois dedos de conversa sobre o assunto. Seja
qual for a nacionalidade do seu portador.
E
é tão raro encontrar este objecto que os poucos que os usam já se riem quando
nos encontramos em manifestações. Em boa verdade creio que, e para além de mim,
apenas mais três ou quatro utilizadores de Pentax andam em manifestações: uma
senhora, que já não vejo faz tempo, um jovem com quem me tenho cruzado amiúde,
e um não tão jovem que encontrei um destes dias.
Mas
este meu espreitar a câmara e, em caso de dúvida p’la distância, o tirar de
teimas p’la correia (acho piada a quem faz questão de usar a correia de origem,
mesmo que incómoda) faz com que encontre outras raridades. Como esta.
O
seu portador, que como eu deve vir da década de 50, usava duas câmaras: esta,
que vi usar quatro ou cinco vezes em duas horas, e uma outra, digital e de
bolso ou quase, com que se entretinha a fazer a maior parte dos registos.
E
se é certo que “um cão reconhece outro cão”, também na fotografia há
cumplicidades, quase que corporativas. Não resisti, eu e o meu nariz comprido,
e meti conversa com o seu dono, elogiando a raridade do objecto e o seu
excelente aspecto, sinal de bons e muitos cuidados. E referi que também tenho,
se bem que use bem pouco, uma velharia que não troco nem por nada: uma Pentax
LX. Rimo-nos e seguimos.
Passado
um nico, foi a sua vez de meter conversa comigo, a propósito da câmara na ponta
do monopé e das perspectivas “aéreas” que assim consigo. Ou bem rasteiras e
discretas.
Em
qualquer dos casos, e seja qual for a idade do fotógrafo ou da sua câmara, o
que conta é o saber ver. A ferramenta e as técnicas, essas, são apenas o meio
que usamos para materializar essa visão. O resto são gostos e prazeres.
By me
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