quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Enganos



Sabemos que a fotografia é um produto criado e desenvolvido na chamada sociedade ocidental.
A Europa e o continente norte-americano são as zonas do globo onde, para além de muito produzirem fotografia, têm formas de a divulgarem massivamente. Quer através das publicações que as usam como ilustração, quer através de publicações que a têm por objectivo, quer através de exposições e galerias de arte.
Se a isto acrescentarmos as questões da língua e/ou caracteres, quase que ficamos restritos a estes continentes.
E quando procuramos mestres ou referências na fotografia, a nossa mente vai, quase que invariavelmente, para essas zonas. Quer os antigos quer o contemporâneos.
No entanto seria presunção a mais entender que a fotografia só aqui acontece. A difusão dos processos de produção e consumo está globalizada e em tudo quanto é sítio (ou quase) se produz fotografia. Boa fotografia.
E se é verdade que necessito de pistas para o meu próprio caminho fotográfico, também é verdade que estou sempre curioso por saber que trabalhos são feitos naquelas zonas do globo de onde nos chegam poucos indícios. Se alguns. Até porque, convenhamos, as raízes culturais do mundo ocidental não são as únicas e outras origens resultam noutras abordagens e estéticas.
Quando posso, tento alargar os meus horizontes: África, América do Sul, Ásia… mesmo mais próximo, como o norte ou o leste da Europa, de onde nos chegam poucos trabalhos.

Um destes dias tropeço neste livro, numa livraria. Tinha estado, guloso, a folhear outras obras, algumas muito bem impressas, de nomes consagrados, quando o meu olhar caiu sobre este. Com a lombada meio escondida no canto de uma prateleira. Agarrei-o com sofreguidão. “Eis algo de muito pouco comum, de onde certamente vou aprender algo”, pensei.
E, dando de barato o seu preço, veio comigo.
O primeiro olhar, ainda antes da caixa registadora, não me surpreendeu por demais. As paisagens, os trajes, os objectos, até a luz, eram-me familiares. Até porque, sejamos honestos, é uma zona do globo mais que mediatizada e não pelos melhores motivos. Apenas dois autores, que fazem trabalhos mais gráficos que fotográficos, sobressaíam pela diferença.  
Depois, fui degustar mais em profundidade o que ali se mostrava. E tive uma sensação de frustração. Não senti grandes novidades no que ia vendo, um após outro. Nas abordagens, nas estéticas, nas linguagens. Destes pontos de vista, a maioria dos trabalhos poderia ter sido feito no Kosovo, no Paquistão, na Colômbia ou em Nova York.
“Que raio!”, pensei. “Será que se me escapa algo?”
E passei da leitura das imagens à leitura das letras. Percebi tudo, então.
Com duas honrosas excepções, os fotógrafos aqui representados, se bem que originários do Médio Oriente, tinham formação académica ou local de residência no chamado “mundo ocidental”.
Aquilo que eu estava a ver não seria uma visão de alguém que ali vivesse e que registasse de acordo com a sua própria cultura e forma de ser, mas tão só olhares de alguém que, podendo ter ligações afectivas ou familiares com os locais, pouco mais é que um estrangeiro na sua própria terra. Quase que qualquer fotógrafo “ocidental” poderia ter feito o que ali está publicado.
Senti-me frustrado e quase que dei por mal empregue o dinheiro gasto.
Só quase, que ver de uma assentada uma boa mão-cheia de imagens bem feitas é sempre lucro.
Mas que não é o que esperava, lá isso não.


By me

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