terça-feira, 27 de outubro de 2009

Trocadilhos


Criar uma conversa simpática e divertida não é difícil. Bem pelo contrário!
Uma das minhas fórmulas é simples: negue-se, a um interlocutor desconhecido, uma afirmação por ele proferida e por ele sabida como certa e inquestionável!
Lá no meu “Oldfashion”, já estou habituado a usá-las e uma delas é a que se segue:
Se me afirma que tem lá em casa uma fotografia tirada, em tempos recuados, por uma câmara como a minha, afirmo que não tem. O olhar espantado é garantido e a insistência também. Eu mantenho a minha, chegando ao ponto, se a conversa o permite, de apostar o meu salário de um ano inteiro contra o que ele ou ela tiver na carteira na altura. Ainda ninguém aceitou a aposta, mas todos querem saber como posso ter tamanha certeza.
E é a minha vez de responder, com um sorriso maroto, que ninguém lhe tirou aquela fotografia, pois, caso contrário, já não a teria. Mas que lha terão feito e que a tenha em casa, não duvido.
Sorrisos, por vezes mesmo gargalhadas, um pedido de que me não levem a mal, pois que gosto de brincar com as pessoas, e o gelo está quebrado. Em 75% dos casos, faço mais uma imagem para o meu projecto.
Desta feita, a coisa foi diferente!
Tinha comprado o que se vê na imagem numa barraca de suposto artesanato africano. Os motivos da compra não vêm agora ao caso, mas sempre posso adiantar que tenho várias caixas com objectos semelhantes.
Pois em chegando ao barzinho da estação, em Lisboa e no regresso a casa, pousei-o em cima do balcão para poder lidar com a chávena, a colher e o açúcar do café que me haveria de manter acordado na viagem.
A empregada que me atendeu olhou para ele e perguntou, espantada:
“Que raio é isto?”
A minha resposta foi curta e esclarecedora:
“Isso mesmo que está a pensar!”
Da outra esquina do balcão um dos três vigilantes que faziam uma pausa na sua ronda afirma:
“É um camelo!”
E logo outro começou a trautear o refrão de uma velha cantiga de um programa infantil de tempos distantes:
“O Areias / é um camelo / tem duas bossas / e muito pelo.”
Pois eu, segurando a chávena entre duas sopradelas de arrefecimento, retorqui placidamente:
“Não é, não!”
“Como não!?”, logo perguntaram “Talvez uma girafa, mas mais parece um camelo.”
Pousando a chávena, esclareci:
“Não é uma girafa, mas também não é um camelo, garanto. Sabe, o camelo tem duas bossas e este só tem uma. É um dromedário!”
O mais velho dos três vigilantes não perdeu a ocasião e alargou o âmbito da troca de opiniões:
“Pois olhe que ele há por aí muitos camelos, sem bossa nenhuma, mas com duas pernas!”
Generalizou-se a conversa, empregadas de um lado, vigilantes do outro, eu mesmo na outra ponta do balcão, bem como um casal, que entretanto tinha chegado e que se debatia com uns sumos não sei de quê, acompanhados com não sei já que bolos.
Quando saí, em busca da nicotina que completaria a cafeína, faziam-se comparações entre o reino animal e o bicho-homem, com burros, ursos, cabras, cobras, águias, mulas, leões e outros.
O incómodo do fim de dia e o ainda inabitual pôr-do-sol a desoras tinham ficado à porta e todos eles levavam mais uma historinha para contar em casa.
Tal como eu mesmo, bem como a satisfação extra de ter distribuído uma mão cheia de sorrisos, completamente de borla.


Texto e imagem: by me

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