Processo de representação
gráfica efémero, pelo menos efémero enquanto popular, foi o da miniatura.
Em medalhões, broches,
tampas de relógios e mesmo em anéis, os abastados ou não tanto traziam consigo
a imagem de quem gostavam ou diziam gostar.
Em desenho de traço ou
silhueta, pintada ou gravada em laca, esmalte ou prata, foi o antecessor da
fotografia no que toca ao retrato portátil.
A sua divulgação surge
nos finais do séc. XVIII e foi rapidamente ofuscada pelo novo processo - a
fotografia – supostamente fiel e muito iconográfico. E mais barato.
Depois das primeiras
experiências e invenções, bastava ser rigoroso quanto à aplicação das técnicas
e fórmulas para que se satisfizesse e surpreendesse o cliente. E orgulhoso
possuidor. E exibidor! E admirador!
Nos tempos que correm as
miniaturas voltaram a ser populares.
Mas, ao invés de estarem
gravadas num medalhão ou escondidas na tampa traseira de um relógio de bolso,
estão gravadas electricamente nos bites e bytes das câmaras fotográficas, nos
discos rígidos ou nas memórias dos telemóveis.
O ritual antigo de puxar
por um fio de ouro e extrair pudicamente de dentro do colo feminino a imagem,
ou o abrir a carteira de dentro da bolsa ou bolso e desdobrar o
porta-fotografias de plástico ou, mais remotamente, de mica, morreu!
Hoje, saca-se do telele,
liga-se o ecran e aí estão elas, as fotografias da namorada/o, rebentos ou
netos. E, se se aceitar tecnologias mais pesadas, nada como recorrer a uma
dessas “canetas-memória”, ligá-las a um computador e, por magia fosfórica, ver
as imagens dos entes queridos. Ou ainda, pô-las a correr pelas auto-estradas
E-mailicas ou sociais.
Claro está que os
telemóveis são roubáveis e os sticks de memória perdíveis entre o prato de
carne e a sobremesa. Mas são cópias, as imagens – pelo menos espero que o
sejam. Não é grave! Haverá sempre a possibilidade de as copiar de novo, de
criar novos ícones em tudo idênticos aos primeiros pelo simples processo de
copy/past ou send.
Mas, no meio de toda esta
tecnologia, nestas transferências energéticas de um integrado para outro, onde
ficam os afectos?
A um óleo, pastel,
miniatura esmaltada ou papel fotográfico, é possível atribuir valores afectivos
simbólicos. Esta folha de papel representa aquela pessoa.
São únicos: a pessoa e o
seu significante!
A matéria de suporte da
imagem assume e fica impregnada de carinhos e dedadas. As tonalidades, os
tamanhos e as texturas tornam-se tão íntimas quanto o corpo da pessoa amada.
E quando o suporte não
existe de facto?
Quando a sua existência
depende de um click e a energia se transforma noutra coisa qualquer?
Quando é repetível até ao
infinito, sem que se perca um só detalhe ou electrão?
Serão os afectos também
repetíveis?
Ou deletáveis?
É possível fazer
copy/past de um sentimento? De um amor ou de um ódio? De um carinho ou afago?
Nesta sociedade de
informação onde a imagem é rainha, não será que a sua super-abundância e
facilidade de processamento e repetição um extinguir da sua importância?
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