sexta-feira, 11 de maio de 2018

All abord




Ontem fui engolido por uma pequena multidão.
Não foi a primeira vez, ainda que procure evitar tais situações que, em regra, acontecem depois de grandes eventos: espectáculos musicais ou desportivos.
Essas pequenas multidões, por vezes grandes, têm uma característica comum: em saindo ou terminando o evento, vêem-se sorrisos estampados das pessoas. Após um “Rock em Rio”, ou um mega concerto no Coliseu ou na grande sala do Parque das Nações, ou um jogo de bola num estádio ou uma corrida na cidade, a esmagadora maioria das pessoas estão a sorrir. De satisfação pelo momento que viveram, de satisfação pela vitória do seu clube, de satisfação pelo que assistiram…
Claro está que em situações de desporto haverá sempre os que estão tristes ou que protestam pela derrota dos seus favoritos. Mas os sorrisos de satisfação estão espalhados pelos restantes. Muitos.
Ontem, a multidão – pequena – que me engoliu vinha da semi final do eurofestival.
Estavam em pequenos grupos, como acontece em eventos musicais, neste casos unidos pelas nacionalidades. E até unidos pela diversidade de nacionalidades, que vi gente com bandeiras distintas em amenas cavaqueiras, unidos apenas pela língua inglesa que usavam.
Mas tinham algo em comum, a esmagadora maioria: não vinham a sorrir. Não vi, naquelas muitas centenas de rostos de quase todas as idade, a satisfação habitual de quem viveu algo que quer guardar na memória. Os seus semblantes, na maioria, estavam quase tão neutros como os de quem acabou de cumprir uma jornada de trabalho ou uma viagem rotineira.
Tal como não os ouvi a trautear as músicas que tenham ouvido. Nem as dos países com os quais se identificam nem quaisquer outras que por lá tenham ouvido.
Não fora as bandeiras e a multiplicidade de origens e seria difícil saber porque estariam todos ali.

A relevância desta minha constatação prende-se com o que venho dizendo, contra ventos e marés: Estes festivais-competição são pouco mais que inúteis! Fúteis, arriscaria a dizer.
A sua mediatização, o negócio que lhes está subjacente, a necessidade que muitos têm de comparecer onde todos os outros estão para se sentirem alguém, cria como que uma “histeria colectiva” breve e inconsequente. O público comparece porque sim, mas o que vivem em tal evento é “sol de pouca dura”. Que a maioria nem recorda, passado pouco tempo, o que ouviu.
Claro que há muitos milhões, por cá e pelo resto do mundo, que contestam o que digo. Que organizam as suas vidas para a tal acompanharem. Que marcam viagens e vã. Que alteram as suas horas e rotinas de jantar para assistirem à sua transmissão.
Mas a verdade é que, se abrirmos os ouvidos nas ruas e cafés, não ouvimos comentários sobre o espectáculo da véspera. Ao invés do que acontecia há uns anos. E se perguntarmos aleatoriamente sobre os vencedores dos anos anteriores, e para além de Salvador Sobral, recordam um intérprete de aparência “sui géneris” e polémica e pouco mais.

Façam-se festivais, que o público gosta. Mas não se “embandeire em arco” na sua importância. Duram tanto na memória quanto a novela que se segue diariamente.



By me

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