Quando eu morrer
não ficarei conhecido, certamente, como um tipo de bom feitio. Ainda que
procure ser afável quando tudo corre bem, se me incomodam ou se me sinto
atingido, reajo nem sempre da forma mais previsível ou agradável.
Foi no Jardim da
Estrela. A tarde corria bem, o dia estava bonito, toda a gente parecia estar de
bem com a vida. A única excepção fora uma das idosas, habituées do espaço, a
queixar-se de todos os bancos estarem ocupados, para ouvirem aquela “porcaria
de música clássica”. Tratava-se, entenda-se, de um concerto de Jazz, ali, ao
vivo e de borla, como as minhas fotografias. Mas, pondo este comentário de
parte, tudo estava a correr pelo melhor.
A certa altura
surgem estas duas mocinhas. Vieram direitas a mim, sabendo do preço que cobro,
e quiseram fazer uma foto. Vinham com a boa disposição própria da sua
adolescência, de ser final de férias, de estarem de regresso de uma temporada
de praia e novos amigos e estarem, de volta a casa, a reencontrarem os velhos amigos.
Típico de um domingo, inicio de Setembro, com óptimo tempo.
No final, ao
verem-se no papel, reagiram como de costume nestas idades, variando apenas nos
apodos com que se mimosearam. No caso, um “Que nojo!”, normal para quem ainda
não encontrou o equilíbrio consigo mesmo. Mas, quando lhes disse que se não
gostassem da fotografia, não a levavam, riram-se a bom rir e fugiram com ela.
Tudo pelo melhor!
Para todos os intervenientes!
Passado um pedaço,
uma hora talvez, hei-las de volta. Desta feita com uma amiga, com quem queriam
repetir a função. Mas, enquanto trocávamos umas graçolas, uma delas, qual Luky
Luke da Estrela, saca do telemóvel, interrompe a conversa comigo e saúda o seu
interlocutor. E, sem mais explicações, zarpam as três para longe. Suponho que
ao encontro de quem quer que estivesse do outro lado da antena.
Não gostei! Não
gostei nem um pouco! Esta mania de que quando o telefone toca tudo pára, tudo
se interrompe, incomoda-me de sobremaneira. Quase que me transforma num louco
furioso! É que, afinal, a vida é bem mais que os telemóveis, as fotografias, os
computadores, as músicas ou o que quer que seja. O mais importante nela é mesmo
aquele ou aqueles com quem estamos e desrespeitá-los assim é bem pior que um
insulto ou agressão. Pelo menos eu não gosto!
Uns vinte minutos
depois, bem medidos, regressam. Acompanhadas as três por dois amigos, vieram
interromper a conversa que eu mesmo estava a ter com uma já conhecida daquelas
paragens, ainda que oriunda do outro lado do globo. E se eu não tinha gostado
que a conversa anterior tivesse sido interrompida por um telemóvel, também não
gostei de ser interrompido em directo, aquando de uma conversa ao vivo. Não
gostei mesmo nada!
Tal como ela não
gostou de ouvir, na sequência do seu “Quero agora fazer a fotografia!” o meu
“Não!”, seguido de “”Não gostei que tivesses interrompido a conversa por causa
do telemóvel; não gostei que tivesses interrompido a minha conversa com esta
senhora só porque chegaste. Não faço a fotografia!”
Estranhou,
insistiu e eu insisti: “As fotografias aqui são grátis porque eu quero. E esta
fotografia eu não faço! Talvez que assim aprendas qualquer coisa de boa
educação!”
Fez beicinho,
bateu o pé em tom de birra, deu meia volta que nem um recruta na parada e,
agarrando na mão de uma das amigas, afastou-se a trotar. Com o resto do bando a
olhar para mim e para ela e a seguir-lhe os passos.
A senhora que
comigo falava, do alto do seu metro e meio, sorriu, acenou que sim e traduziu
para a amiga a conversa. Suponho que tenha sido factual, que eu de indiano nada
sei. Sei, isso sim, que a companheira sorriu também e acenou que sim
igualmente. E, após mais umas banalidades sobre o assunto, o tempo e a música
que se iria ali escutar, afastaram-se para usufruir, prazenteiramente, o resto
daquele domingo saboroso.
Quando morrer
certamente que ninguém dirá: “Aqui jaz um tipo de bom feitio.” Mas, caramba,
nessa altura também não estarei por cá para ouvir e retorquir. Espero, no
entanto, que esta mocinha, agora mal-educada, continue por cá por muito tempo e
com melhores atitudes para com os outros. Se assim for, valerá a pena o que de
mim disserem!
By me
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