quarta-feira, 3 de março de 2010

Partilhas


Partilhar é uma das coisas mais saborosas! E um dos melhores momentos de partilha é a refeição. O prazer da boca, a satisfação de uma necessidade básica e o fazermo-lo com alguém que estimamos é bom!
Pois um destes dias fui jantar com três compichas de trabalho. Fora do trabalho, entenda-se, o que torna o evento raro: as mais das vezes partilhamos as refeições na cantina, meio a correr entre duas tarefas. Aliás, nem a isso se pode chamar refeição mas antes um “meter de combustível”.
Pois o local consensualmente escolhido foi um centro comercial. O que até nem seria mau de todo, pois que neste, como em alguns outros, há bons locais de comer.
O que já não foi consensual foi ponto exacto e o que comer ou partilhar. Optaram eles, e eu tive que alinhar, por uma esplanada. É um local aberto, repleto de mesas e cadeiras, em que cada comensal escolhe o tipo de restaurante e respectivo repasto e vai lá abastecer-se, regressando àquele espaço comum e partilhar a mesa com os restantes. Mas só a mesa, que o que nela estiver para ser degustado pode ser tão variado quanto hambugueres no pão, comida chinesa, massas italianas ou um cozido à portuguesa. Se se partilha o espaço e as presenças, já a partilha do que se ingere, a verdadeira partilha que até pode ser o comermos todos do mesmo tacho, esfuma-se com a modernidade do fast food.
Pois o meu azar na escolha do local foi um pouquinho mais longe: na esplanada em causa existiam vários televisores de grandes dimensões que, naquela noite, estavam sintonizados na transmissão de um jogo de futebol. Logo isto haveria de calhar a mim, que não suporto futebol e, por sua causa, já me fez apanhar mais água no lombo, frio nos ossos e transpiração onde não me atrevo de confessar, do que gostaria.
Mas as mesas têm quatro lados, pelo que a minha solução foi ficar de costas para o mais próximo. Sendo que não nos impingiam o som, foi a confirmação do velho ditado: “Longe da vista, longe do coração”.
A dado momento uma das equipas (nem sei quem jogava) marcou um golo. Terá certamente sido um belo golo e decisivo para o resultado final, que a maioria das pessoas presentes na esplanada soltou gritos de regozijo. Incluindo um dos meus compinchas de trabalho que, estando à minha frente, ia deitando um olhinho para o malfadado do ecrã, por entre as garfadas e a conversa.
O que me deixou mesmo de cara à banda foi o que fez de imediato:
Interrompendo a conversa, sacou do telemóvel e ligou para alguém. E quando o atenderam, disse qualquer coisa como isto:” Viste aquilo? Grande golo! Espectacular! Olha, estão a mostrar outra vez… Maravilha! Até logo.” E desligou o telefone.
Dando por mim de boca aberta e garfo parado a meio caminho do prato para ela, sorriu timidamente e explicou: “ Era para o meu pai. Temos este hábito de comentar os golos que vemos, estejamos onde estivermos.”

Sobre o futebol e a sua psicologia de massas, já muitos e bons se pronunciaram; sobre a telefonia sem fios e como ela aproxima as pessoas também; como as tecnologias de informação, telemóveis incluídos, criam relacionamentos virtuais e o que isso significa para o bem-estar dos cidadãos também já foi largamente descrito.
Agora juntar tudo e partilhar as emoções de um jogo de futebol, que aconteceu lá não sei onde, com alguém que está algures em qualquer lado é novidade. Pelo menos para mim.
E é uma partilha que me desagrada, já que interrompe a mais básica partilha, que é o comer.
Se um dia possuir um restaurante, não apenas não existirão televisores como se desaconselharão os comensais de usarem os telemóveis.
Tal como pedirei isso mesmo a todos os que comigo partilharem refeições!
Porque, no fim de contas, partilhar é uma das coisas mais saborosas que podemos fazer!


Texto e imagem: by me

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