domingo, 13 de março de 2016

O fechar de ciclos



No dia 11 de Março de 2008 publicava eu estas linhas, sem fotografia:
“Suficientemente ébrio para ser o motivo de chacota da garotada; suficientemente sóbrio para sentir curiosidade.
Suficientemente grosso para ter a língua entaramelada; suficientemente lúcido para perguntar, com timidez, se também podia.
Suficientemente bêbado para mal se aguentar direito; suficientemente arejado para guardar com mil cautelas a fotografia no seu saco maltrapilho.
Suficientemente toldado para me confidenciar alguns dos detalhes miseráveis da sua vida profissional; suficientemente ser humano para querer que se escrevesse por trás da foto o meu nome, a data e o local para mais tarde recordar.
Suficientemente gente para, ao afastar-se, agradecer com um aperto de mão e pedir desculpa de não estar nos seus melhores dias.
Suficientemente bom para, ao ir para onde quer que fosse naquele fim de dia, ainda olhar para trás com um sorriso para a garotada que dele chacoteava.
Quem? Não sou suficientemente despudorado para aqui e assim o exibir!”

Nessa época tentava eu que o meu projecto de photógrapho à-lá-minuta pudesse funcionar que não apenas no jardim da Estrela. E ensaiei umas fotografias na estação do meu bairro.
Recordo (e estão no arquivo) que para além da acima descrita fotografei o grupo de quatro adolescentes que do pobre coitado chacotearam um bom bocado para além do limite. E que, em ele se indo, me ouviram das boas, sobre o menosprezar “quem está na mó de baixo”.

Há coisa de um mês, talvez mês e meio, sou abordado no comboio ao regressar a casa. Quem me abordava conhecia-me, ainda que o contrário não fosse verdade.
Até ao momento em que ele falou de termos feito uma fotografia na estação.
Lembrei-me dela, naturalmente, e do que em torno dela tinha sucedido.
O meu espanto foi que ele, agora homem, também se lembrava do discurso que eu lhes havia dado face à atitude deles para com o homem.


Ainda que com oito anos de atraso, fiquei a saber que naquele dia o mundo tinha melhorado um nico.

By me 

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