Esta fotografia
foi feita em ’82, talvez em ’83, não garanto. À época, não ficava incluso nas
fotografias a data e hora. E os ficheiros eram em papel.
Mas é curioso o
que recordo dela, apesar de não haver memória digital.
Recordo de ter
sido feita em casa da família, usando como estúdio a sala comum e já tarde na
noite.
Recordo ter usado
a então recém comprada Linhoff Kardan Collor 9x12, adquirida em enésima mão para
entrar no mundo da fotografia publicitária. Uma objectiva Schneider de 150mm,
f/5,6 e dois chassis duplos para a película, era tudo o que vinha com ela. Mas
quanto bastava.
Recordo que usei
lâmpadas de 200w e 500w, montadas em casquilhos de loiças que, por sua vez,
estavam fixados com grosso arame e braçadeiras de mangueira em varões de
cortinas de casa de banho, extensíveis e colocados na vertical. Não havia
dinheiro mas havia uma forte vontade de fazer, o que conduzia ao improviso.
Recordo de ter
usado para medição de luz um Seconic de quadro e ponteiro e um spotmeter Pentax
digital.
Recordo ter usado
película rígida Agfa, balanceada para luz artificial de 3200K e de
sensibilidade 160 ASA.
Recordo ter feito
os cubos de gelo ao lume. Sim, não é uma gralha esta afirmação. Foram feitos
num tacho, a partir de gelatina e água e formatados no congelador nas
respectivas formas. Deste modo, mantinham-se inalterados apesar do calor da
iluminação.
Recordo ter tirado
o fundo da garrafa com azeite e um ferro em brasa. Tarefa delicada mas necessária,
se queria garantir a posição dela no enquadramento ao mesmo tempo que
controlava a quantidade de líquido que sairia pelo gargalo.
Recordo ter esta
imagem sido feita como resultado de um desafio entre compinchas de fotografia,
em que o tema era “publicidade a bebidas mas sem marcas evidentes”.
Ainda possuo, e
para além da memória, os copos, a bandeja e os livros. E os fotómetros, claro. Suponho
que duas dessas lâmpadas também. A câmara foi-se, com muita pena minha, mas a
vida assim o impôs. Já a fotografia original sei que a tenho, mas não sei com
rigor onde.
No entanto, e no
meio de tudo isto e bem mais importante que recordar ou não, que possuir ou não,
é o ter feito.
É ter aceite um
desafio, que sabíamos complexo, ter pensado nele um bom pedaço, ter preparado a
coisa com antecipação e cuidado e ter realizado aquilo a que me tinha proposto.
Mesmo que num salutar desafio entre compinchas, sem vencidos nem vencedores.
Tínhamos nós a
vantagem sobre os dias de hoje de estes desafios com este tipo de tecnologia
serem morosos, trabalhosos e dispendiosos. O que nos levava a ter bastantes
certezas antes de premir o botão do obturador.
Disse-me uma vez
um arquitecto que um projecto de um edifício deve demorar a ser planeado pelo
menos o dobro do tempo do que leva a ser construído.
Nunca planeei ou
concebi um prédio, mas o conceito aplica-se igualmente à fotografia.
By me
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