Hoje é Domingo.
E os Domingos são
dias importantes na nossa cultura.
São os dias que
marcam o fim da semana;
São os dias em que
o comércio está fechado, excepto se centros comerciais ou supermercados;
São dias em que os
que não trabalham aproveitam para fazer umas visitas familiares ou umas visitas
em família aos centros comerciais;
São dias em que os
motoristas de táxi se exasperam com os “dominguinhos”, aqueles que só conduzem
ao domingo;
E são dias de ir à
missa, que o Domingo é o dia do Senhor, de acordo com a tradição e a religião.
E também eu, pese
embora agnóstico convicto desde que me conheço, fui a muitas missas ao domingo.
Nunca como crente, nem mesmo como acompanhante forçado de algum crente.
Não corro o risco
de exagerar, nem pouco mais ou menos, se disser que ao longo da minha vida
profissional foram várias centenas as missas dominicais que transmiti
televisivamente. Foi um trabalho que sempre me agradou fazer, de entre os
muitos que o ofício tem: as questões estéticas envolvidas, os rigores técnicos
exigidos, o peso da importância daquele trabalho para quem o vê com atenção, as
questões de semiótica que há que cumprir…
Numa conversa com
alguém que também o fazia amiúde, disse-me ele: “A igreja tem a liturgia da
palavra, nós temos a liturgia da imagem.”
Pois uma ocasião,
faz já muito tempo, estava a transmitir uma missa dominical. Feita nos estúdios,
era montado um altar, um crucifixo, um simulacro de rosácia ou vitral e um ambão
ou púlpito. Naturalmente, também um estrado em degrau onde se acomodava o coro.
Hábito meu então,
estranho será mas era hábito, que quando algo me estava a correr muito bem ou
muito mal e tinha as mãos ocupadas, punha um cigarro apagado no canto da boca e
ali ficava, uma hora ou mais, até que terminasse a tarefa. Foi o caso daquele
domingo, naquela missa, naquele estúdio.
A dado momento,
fazia eu um traveling (movimento de câmara lateral ou frontal) orientado para o
altar e de costas para o coro, concentradíssimo na suavidade e lentidão de
movimento que se impunha, e sinto um leve bater no ombro, chamando-me. Olhei
para trás, pelo “rabo do olho”, tentando perceber quem assim me chamava e
interrompia, ou quase, o que estava a fazer.
Tratava-se de um
dos jovens do coro que, muito aflito por eu estar há tanto tempo com um cigarro
apagado na boca, me oferecia lume na presunção de que não o teria.
Caricata a
situação, considerando que não se fuma a exercer aquele ofício e que não se
fuma no decurso de uma missa, dominical ou não, num estúdio ou numa igreja,
seja-se crente ou não crente.
Hoje seria impossível
tal acontecer!
Já não sou
operador de câmara de televisão; as missas já não são celebradas e transmitidas
de estúdio mas antes de igrejas; este é o segundo Domingo consecutivo que
passarei sem ter um cigarro apagado ou aceso no canto da boca.
By me
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