Chovia.
Não uma chuva como
esta, fracota, quase sem personalidade, pouco mais fazendo que garantir que o
que está molhado, molhado fica.
Não! Era uma
daquelas chuvas fininhas, das que molham tolos quando estou em casa, mas que,
puxada a vento como estava, molhava tudo, mesmo estando em casa.
Era de tarde.
Uma tarde
medianamente clara ou escura, consoante as nuvens que passavam, ao invés desta
noite que, em pondo-se o sol, só voltaremos a ter luz lá pela manhã, amanhã.
Era na estação de
comboios.
Não nesta rua
suburbana, pacata quanto baste, com dois cafés, muitos prédios e falta de
lugares de estacionamento. Era mesmo numa estação de uma das linhas mais
movimentadas do país e que, àquela hora, não o parecia.
Eu estava com
pressa.
Não com o tempo
por minha conta, a pontos de descer de casa para fazer uma fotografia, uma
fotografia qualquer, da minha rua à chuva. Estava mesmo com pressa, que tinha
horas certas onde estar e deveria estar a chegar o comboio que me levaria a
tempo. Quando não, chegaria atrasado, coisa que, ao contrário de fotografia, não
gosto mesmo.
Pois em chegando a
um lugar que não este, num momento que não este, com um tempo que não este e
com uma pressa que agora não tenho, sou abordado em trânsito.
Um cavalheiro,
talvez angolano, e já com alguma idade, pergunta-me se pode falar comigo. Digo-lhe
que sim, e tal, o comboio, as horas…
Mas ele sorri e
pergunta-me, mesmo já sabendo a resposta, se sou fotógrafo.
Tento coisa e tal,
despachar a conversa, que o comboio estaria mesmo a chegar, mas…
Mas ele insiste,
que já me tem visto por ali, de câmara ao ombro ou na mão, usando-a, e queria
saber que tipo de fotografia fazia eu. Porque, acrescentou, gostaria de
aprender mas não sabia como ou onde, e se eu poderia…
O comboio fez-se
ouvir, para além da curva. Se eu corresse e o deixasse ali, ainda o apanharia e
chegaria a tempo. Mas aquela abordagem…
E ali ficámos um
nico, de conversa. Ele contando-me que equipamento tinha, que gostava de
fotografia macro da natureza mas que o conjunto de objectivas que tem não
permitem grande coisa, que gostaria de me acompanhar para aprender algo mais,
se eu não me importasse…
Fiquei com o ego
cheio, naturalmente, para além de uma mancha na minha pontualidade. Mas sempre
lhe falei em métodos económicos para o conseguir, num ou dois livros que, mais
que dicas como nas revistas, lhe poderiam dar conhecimentos sólidos no tema,
nas características de um tripé para o tipo de trabalho que queria fazer… ficámos
um nico de conversa.
Curiosamente,
separámo-nos sem trocarmos contactos, o que é raro neste tipo de conversa. Mas
ele anotou as minhas sugestões, incluindo o nome das obras.
Onde cheguei com
quase um quarto de hora de atraso não expliquei o porquê. Não teria que o
fazer, mas não o fiz. Que talvez não fosse entendido que alguém atrasar-se para
ajudar um desconhecido na rua, mesmo que com dicas e sugestões sobre
fotografia, é uma razão séria e válida para justificar a falta de pontualidade
que prezo.
Seria bem mais difícil
de explicar o atraso se perdesse outro comboio para conseguir fazer uma
fotografia do local ou intervenientes. Que não fiz.
Fica esta em
alternativa que, não sendo do local, do momento, do clima ou das pessoas, é o
que é.
E fico eu com uma
resposta por dar a uma pergunta que me fez. Há anos que procuro responder e
ainda não sei: Que tipo de fotografia faço eu?
By me
Sem comentários:
Enviar um comentário