sábado, 8 de novembro de 2014

Privatizações selvagens



A questão dos serviços públicos ou estratégicos é francamente mais importante que apenas o negócio em causa, lucros e prejuízos.
Três exemplos simples:
A comunicação entre Estado e cidadãos. Quer se trate de fiscalidade quer se trate de justiça, elas acontecem usando sistemas de comunicação. Electrónicas ou postais convencionais. Ora se estes serviços de comunicação dependerem de empresas privadas, cujo objectivo, mais que a eficácia é o lucro, podem com esse objectivo preterir determinados canais de comunicação na sua velocidade ou eficácia, em prol de outros mais rentáveis.
Pode, assim, acontecer que a comunicação de um julgamento, que tem prazos definidos por lei, ser atrasada na sua entrega. Ou de uma penhora. Ou da cobrança de um imposto. E sendo que os prazos são contados, de acordo com as regras actuais, a partir da data de expedição, estão os destinatários dependentes do bom funcionamento de uma empresa privada cujo objectivo, repito, é o da obtenção de lucro com a sua actividade.
A energia. Os hospitais dependem do fornecimento de energia. Para iluminação, controlo de ar, cirurgias, suportes de vida. Mas pode ser mais dispendioso a manutenção dos fluxos energéticos nos níveis desejados para uma zona onde esteja um hospital que para uma zona onde estejam fábricas. Na lógica do lucro de uma empresa privada de produção ou distribuição energética, faz mais sentido manter em bom funcionamento aquilo que gera mais lucro.
Transportes. Uma rede rodoviária de passageiros privada tem que dar lucro. É para isso que existe o investimento do empresário. Manter em funcionamento em serviço nocturno as carreiras urbanas ou suburbanas aumenta os custos por passageiro, já que existem menos em trânsito. Faz sentido, do ponto de vista empresarial, suprimir carreiras com poucos passageiros. Mas aqueles cidadãos que se instalaram numa dada zona da cidade ou dos subúrbios, contando com os transportes existentes e tendo horários de trabalho nocturno, ficarão sem ter como aceder aos postos de trabalho. Ou mudam de casa, ou mudam de trabalho ou são obrigados a investir num automóvel.

Como estes três exemplos, muitos outros se podem apresentar.
As privatizações selvagens de sectores públicos estratégicos, tendo por mero objectivo a rentabilização e negligenciando os utilizadores e as consequências de uma diferente exploração dos serviços, são o espelho dos conceitos de sociedade que uma classe abastada defende, deixando à sua sorte aqueles que não têm meios ou força para as contrariar.
É fácil decidir nesta linha para quem tem um representante legal a tempo inteiro, um hospital privado às ordens ou um veículo com motorista privado.
Os outros, os que alimentam com a mais-valia do seu trabalho as mordomias dos decisores, que se cuidem!

Até um dia.

By me 

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