quinta-feira, 22 de junho de 2017

Ser ou não ser



Já me aconteceu algumas vezes: encontrar objectos perdidos ou esquecidos. Carteiras, chaves, documentos de identificação, sacos com objectos diversos.
De todas elas fiz aquilo que acredito ser o normal: procurar que o legítimo dono recupere o que é seu.
Já o fiz deixando o objecto num café nas proximidades. Os cafés são, sabemos, a praça pública de antanho, junto com mercearias ou farmácias. As pessoas conhecem-se, trocam ideias e novidades, e há sempre quem saiba da vida dos vizinhos.
Já o fiz entregando nas autoridades policiais. No fim de contas, é um lugar seguro para se deixar o que se encontra e, presume-se, farão bem mais e melhor que eu para encontrar o proprietário. Nem sempre fui bem recebido neste acto.
De uma das vezes, recordo-o como se fosse ontem, a agente que me atendeu na esquadra de Sintra, virou e revirou o que lhe entreguei e, olhando para mim, perguntou-me pelo resto. Fiquei de tal forma que só fui capaz de responder “Vamos fazer de conta que a senhora não disse isso e recomeçar a conversa. Encontrei isso em tal local e gostava que o devolvessem a quem aí está identificado.” Ficou pálida e lá tratou de registar a ocorrência sem mais insinuações.
De outra fui recebido com a maior das cordialidades, a carteira foi revistada e tudo anotado, incluindo o dinheiro que continha, a minha identificação registada e saí da esquadra com a convicção que o seu dono a recuperaria através do bilhete de identidade que lá estava.
De uma outra, e após alguns telefonemas para as escolas cujos cartões referiam, fiz chegar em mão no dia seguinte a carteira, o dinheiro e o passe, ao jovem que a havia perdido na estação de comboios, tarde na noite.
Nem estas nem outras histórias equivalentes fazem de mim alguém especial. Fiz o que tinha que fazer, exactamente como gostaria que alguém o fizesse se fosse ao contrário. Enquanto cidadão outra coisa não poderia fazer para tranquilidade da minha consciência.

É por isso que fico “incomodado” quando leio uma notícia que relata ter sido devolvido um saco com bastante dinheiro. É uma história que não deveria ter direito a espaço de jornal. Independentemente da condição social dos intervenientes.
O devolver a seu dono o que não nos pertence é um acto que deveria ser natural, tão natural quanto o quer ser aquele a quem é devolvido. E o ser muito dinheiro e quem o achou ser muito pobre não deveria ser condicionante para que o não seja.

A honestidade não tem fronteira traçada algures entre cinco e cinquenta euros. Ou se é ou se não é.

By me 

Sem comentários: