quarta-feira, 12 de março de 2025

Memórias




Vocês me desculpem mas não resisti. E apesar de ter a DSLR ali ao lado, em cima da mesa, foi mesmo com o telemovel.
Conheço o local há um ror de tempo. Desde os meus tempos de estudante ainda numa época pré-revolucionária. Ficava-me no caminho do liceu, quando decidia não fazer o transbordo de autocarro e poupar o segundo bilhete.
Antes de abrirem as portas ao público, este café, que agora também serve refeições, entregava de borla os bolos da véspera a quem lá fosse. E havia sempre alguns miúdos a fazerem fila, vindos de um bairro de lata nas imediações.
Nunca ali fiz fila. Preconceitos da época faziam com que os meninos do liceu não se misturassem com os meninos de pé descalço. Como se uns valessem mais que outros! Além de que as rivalidades entre os grupos dos já não tão meninos por vezes terminavam com arnica, merurocromo ou mesmo uma ida ao posto de enfermagem.
Este era um dos bolos que eu cobiçava noutros espaços, de permeio com as pirâmides, os duchasse ou as bolas de berlim. Com creme, claro. Mas estas últimas surgiam todos os dias em frente ao liceu, no intervalo grande, pelas mãos de uma vendedeira ambulante que as trazia num cesto de vime coberto com um pano branco. Quando tinha poupado nos bilhetes quanto bastasse, lá ía eu escolher uma, a que tivesse mais creme, e lambuzar-me até às orelhas.
Hoje já não há vendedeiras às portas dos liceus, com panos e batas brancas. E já não me lambuzo até às orelhas, que fico com as barbas cheias de doces vestígios. Mas os paladares são os mesmos, mesmo que comidos com faca e garfo.

By me

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