Com o passar dos
anos e a manutenção de interesses e actividades, acaba-se por coleccionar
situações menos comuns. Dirão alguns que únicas, pela sua raridade. E esta foi
uma delas que, apesar de já dela ter falado, aqui fica de novo. A limpeza de
equipamento recordou-ma.
Naquele dia saíra
de casa para tomar a bica matinal. O costume.
Como de costume
também, levava comigo uma câmara fotográfica.
As mais das vezes
levo uma de bolso. O trajecto é pequeno, a rua é sempre a mesma e nem sempre
cruzo a porta de casa com uma ideia definida. Mas como elas surgem vindas quase
do nada, vou sempre prevenido.
Outras vezes levo
uma DSLR pendurada no ombro. Ou porque a luz está apetitosa, ou porque tenho
qualquer coisa a fazer-me comichão nos neurónios, ou apenas por palpite.
Nesse dia foi por
palpite, sem nenhum outro motivo específico.
E foi também por
palpite que, em saindo do prédio, no lugar de virar para o café, virei para o
lado oposto. Alguma coisa me dizia que indo até à ponta da rua seria
fotograficamente compensador.
Foi, mas não da
forma que pensava.
A meio caminho,
seguindo pelo passeio e olhando para coisa nenhuma ou para tudo em profundidade
como sucede nessas alturas, ouvi um “Plink”. Demasiadamente forte e perto para
ignorar.
Olhei e vi: tinha
o filtro “UV” da câmara estalado.
E estalara porque,
de sob a roda de um carro que acabara de passar, saltara uma pedrinha,
minúscula, que embateu em cheio no bendito filtro, partindo-o. Deixando-o no
estado em que se vê.
Desde que me
conheço ligado à produção de imagem que vou cuidando do equipamento. Não o
trato como se de peças raras de um qualquer cristal afamado fossem. O que tenho
é para ser usado. Mas cuido do que tenho ou uso com o cuidado necessário à sua
preservação e bom estado de funcionamento.
E uma das coisas
que aprendi desde cedo foi a usar um filtro protector nas objectivas. Em todas
as que possuo e em que é passível de colocar um, está lá.
É discutível este
hábito. Alguns argumentam, e com motivos para tal, que um filtro óptico é isso
mesmo: filtra a luz. Por muito neutro que seja, retira sempre algo à qualidade
da imagem, quer seja por reter algumas das radiações luminosas, quer seja por alterar
o percurso da luz, deteriorando a nitidez da imagem resultante.
De algum modo têm
estes razão.
Mas pertenço eu ao
grupo que argumenta a favor. Estes filtros são da melhor qualidade possível,
reduzindo em percentagens ínfimas a nitidez, sendo o tipo de radiação que é
retida, na casa dos ultravioletas, negligenciável e, por vezes, prejudicial.
Mas, mais importante que tudo o mais, é o filtro a área de vidro da objectiva
que está exposta aos elementos – poeiras, água, gorduras – e que tem que ser
limpa. E, por muito cuidado que se tenha, algum risco mínimo sobrevém dessa
limpeza. E esses sim, são prejudiciais à qualidade da imagem resultante. Além
do mais, e por muito cuidado que se tenha, um toque ou pequena pancada acaba
sempre por acontecer e, havendo filtro, é nele que sucede.
E convenhamos que
é bem mais fácil e económico, ao fim de alguns anos, substituir um filtro que
já não se encontra em bom estado que toda a objectiva.
Abençoado filtro
que trazia naquele dia. Que me poupou à despesa de uma objectiva nova.
Esta fotografia já
tem uns anitos e é irrepetível. Guardei o filtro, assim partido, para servir de
testemunha de um acontecimento raro. Mas, passados tempos e com o manuseio,
acabou por se desmanchar, sobrando pequenos pedaços de vidro e um aro. Os
primeiros foram fora, o segundo está ali guardado, na gaveta das coisas velhas
e disfuncionais, que nunca se sabe para que poderá vir a servir.
Já a memória e a
estória, essas, ficarão para sempre naquele cantinho das coisas raras que
qualquer fotógrafo tem.
By me
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