Já foi hábito meu, que ultimamente pouco tenho praticado: num balcão pedir um café sem manteiga.
Os motivos para tal são vários, que passam pelas brincadeiras e quebra de rotina para quem está do outro lado e terminam na rapidez com que sou atendido.
Por via desta expressão, aparentemente e absurda, tenho já vivido situações caricatas em que umas vezes sou eu a vítima, outras o empregado, outras ainda clientes ao meu lado.
Desta feita foi diferente:
Entro num café de estação onde sou cliente, digamos, uma vez em cada quinze dias. Mas acabo sempre por meter conversa o que, aliado ao meu visual, me transforma em tudo menos num cliente ocasional e anónimo.
Pois como a loja estava vazia, uma das mocinhas que ali está viu-me aproximar e tratou de fazer o expresso do costume. E quando encostei no balcão perguntou-me, sorrindo:
“Um café cheio, verdade?”
Não me fiquei e retorqui:
“Isso! E sem manteiga, por favor!”
“Sem manteiga?!”, espantou-se ela, como eu esperava.
“Claro! Já provou café com manteiga? Eu já e não gosto. Por isso peço sem manteiga.” Tudo isto dito com um ar perfeitamente impassível, ainda que rematado com um sorriso de orelha a orelha.
Foi a vez dela me deixar de boca aberta:
“Pois olhe que até já bebi café com manteiga e até gostava.” O seu sotaque brasileiro acentuou-se “ Quando era pequena o meu avô bebia disso de manhã e, só um pouquinho, deixava-nos provar.”
“Pois aposto que viviam no campo, o seu avô tinha animais de grande porte na quinta e as manhãs eram bem frescas, de Inverno!”
“Pôxa! Como sabe isso? O Paraná é parecido com Portugal e tínhamos cavalos na roça.”
“É que era isso que o meu avô fazia. Com um capote vestido por cima da roupa de dormir, à luz de uma candeia de petróleo, ia acordar e dar de comer às vacas antes do amanhecer. Mas antes de enfrentar o orvalho nocturno, bebia uma malga de café com uma colher de manteiga, para aquecer o corpo e a alma. Só depois de os animais terem forragem fresca na manjedoira é que regressava a casa, lavava-se e vestia-se comia o pequeno-almoço, na altura chamado de primeiro-almoço.
“É! Outros tempos e boas memórias!” E continuava a atender outros clientes que, entretanto, tinham chegado e queriam levar qualquer coisa no estômago na viagem que os levaria de volta a casa.
Quando me afastei do balcão, despesa paga, olhei em redor. Os que ficavam tinham cara de quem tinha passado todo o santo dia a trabalhar. Mas consegui vislumbrar em alguns, atrás do cansaço, um brilhozinho de nostalgia alegre.
Texto e imagem: by me
Os motivos para tal são vários, que passam pelas brincadeiras e quebra de rotina para quem está do outro lado e terminam na rapidez com que sou atendido.
Por via desta expressão, aparentemente e absurda, tenho já vivido situações caricatas em que umas vezes sou eu a vítima, outras o empregado, outras ainda clientes ao meu lado.
Desta feita foi diferente:
Entro num café de estação onde sou cliente, digamos, uma vez em cada quinze dias. Mas acabo sempre por meter conversa o que, aliado ao meu visual, me transforma em tudo menos num cliente ocasional e anónimo.
Pois como a loja estava vazia, uma das mocinhas que ali está viu-me aproximar e tratou de fazer o expresso do costume. E quando encostei no balcão perguntou-me, sorrindo:
“Um café cheio, verdade?”
Não me fiquei e retorqui:
“Isso! E sem manteiga, por favor!”
“Sem manteiga?!”, espantou-se ela, como eu esperava.
“Claro! Já provou café com manteiga? Eu já e não gosto. Por isso peço sem manteiga.” Tudo isto dito com um ar perfeitamente impassível, ainda que rematado com um sorriso de orelha a orelha.
Foi a vez dela me deixar de boca aberta:
“Pois olhe que até já bebi café com manteiga e até gostava.” O seu sotaque brasileiro acentuou-se “ Quando era pequena o meu avô bebia disso de manhã e, só um pouquinho, deixava-nos provar.”
“Pois aposto que viviam no campo, o seu avô tinha animais de grande porte na quinta e as manhãs eram bem frescas, de Inverno!”
“Pôxa! Como sabe isso? O Paraná é parecido com Portugal e tínhamos cavalos na roça.”
“É que era isso que o meu avô fazia. Com um capote vestido por cima da roupa de dormir, à luz de uma candeia de petróleo, ia acordar e dar de comer às vacas antes do amanhecer. Mas antes de enfrentar o orvalho nocturno, bebia uma malga de café com uma colher de manteiga, para aquecer o corpo e a alma. Só depois de os animais terem forragem fresca na manjedoira é que regressava a casa, lavava-se e vestia-se comia o pequeno-almoço, na altura chamado de primeiro-almoço.
“É! Outros tempos e boas memórias!” E continuava a atender outros clientes que, entretanto, tinham chegado e queriam levar qualquer coisa no estômago na viagem que os levaria de volta a casa.
Quando me afastei do balcão, despesa paga, olhei em redor. Os que ficavam tinham cara de quem tinha passado todo o santo dia a trabalhar. Mas consegui vislumbrar em alguns, atrás do cansaço, um brilhozinho de nostalgia alegre.
Texto e imagem: by me
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