terça-feira, 17 de março de 2009

O porta-moedas


Quando os vi chegar, o pequenito pela mão da mãe, ainda pensei que queriam fazer uma fotografia. Tinham desviado o caminho, directos a mim e o passo era decido.
Mas quando se aproximaram o suficiente para lhes notar detalhes nas feições, pareceu-me que não. Pelo menos seria uma estreia, o fotografar alguém, com a minha caixa, que estivesse a chorar. Aliás, bem que se poderia dizer que a senhora estava lavada em lágrimas, que a maquiagem estava escorrida pela cara abaixo, à mistura com as lágrimas.
A cara do pequenote também estava de acordo, bem séria, não chorosa mas com ar de bem preocupado.
A abordagem foi incomum: perguntou-me ela se eu teria encontrado, ou sabido de alguém que tivesse encontrado, um porta-moedas perdido. Não tinha eu, com pena minha, que o caso parecia grave e preocupante. Tanto mais que hoje é dia 17 e ainda falta uma boa quinzena para o final do mês e o respectivo pagamento de salário.
Afastaram-se, olhando em redor mas com ar de quem não tem muitas esperanças. O que eu entendi.
Um porta-moedas perdido não é fácil de reencontrar, a menos que seja dentro de casa. E um jardim, por muito familiar que nos possa ser, não é a nossa casa!

Passadas bem umas duas horas, eis que me surge uma conhecida. Não quer ser fotografada, não autoriza que a foto do neto esteja na net, “Que os pretos vão-na lá roubar para fazer bruxaria”, mas fora isso até que é simpática na conversa.
Conta-me ela que ali ao lado, portas meias com a basílica, fica a fundação Pró Dignitate, presidida por Maria Barroso e que a tal senhora, sempre seguida pelo filho, tinha por lá passado em busca do tal porta-moedas perdido. E a história ganhou detalhes:
Teria ela dado a carteira ao pequeno para ir comprar um gelado. Este, na volta, sentou-se no degrau para o comer e, em acabando e vindo embora, lá ficou: carteira com dinheiro e documentos.
Pelo que me foi contado, aquela que preside a instituição que fundou, soube do caso e perguntou-lhe se teria como regressar a casa, ao que terá sido respondida que não e que, como se não bastasse, residia em Sesimbra.
Aqui a história, contada em tom de fofoquice, ganhou foros de conto de fadas: A Maria Barroso terá aberto a sua própria carteira e ter-lhe-á dado 50 euros para que pudessem regressar.
Ao que me disse quem me contou o desfecho, não terá sido a primeira vez que esta Senhora terá tido atitudes equivalentes, perante situações de aflição e sem esperar algum tipo de retorno.
Mas, se bem entendo o gesto, o retorno é interior, é o saber-se a fazer bem sem olhar a quem, apenas porque é preciso fazê-lo!

Daqui da esplanada do Jardim da Estrela, bem em frente ao edifício a cuja porta tal terá acontecido, o meu obrigado a este Senhora, com S maiúsculo, por ter este e outros gestos semelhantes.
Viva quem faz!


Texto e imagem: by me

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